domingo, 19 de maio de 2019

cinema de invenção


“Quando Luiz Rosemberg Filho fez ‘A$$untina das Amérikas' o Brasil penava há pouco mais de uma década com os efeitos do golpe civil-militar. O filme reflete muito desse momento, colocando em cena personagens representativos de tempos tão sombrios”
- Trecho do texto escrito por Firmino Holanda, pesquisador, cineasta e professor da UFC, para o catálogo da VI Mostra Outros Cinemas, maio de 2014, em Fortaleza.
Rodado em 1976, A$$untina abriu o evento com a presença do diretor, que durante a semana foi merecidamente homenageado, com o reconhecimento por sua importância como um dos mais autênticos, criativos e combatentes nomes do cinema brasileiro.
Clássico do chamado cinema experimental, independente, que se fazia à margem dos modelos dominantes, o filme é o mais expressivo do pensamento e estética da cinematografia de Luiz Rosemberg, com quase 50 títulos nos 50 anos de atividade. Muitos de seus filmes foram censurados, praticamente todos sem viabilidade de lançamentos nos moldes comerciais.
O cineasta nunca fez concessão a modismos, nunca se submeteu às regras de produção que interferissem em suas propostas. Dizia que com o fim da ditadura, a censura passou a se chamar “burocracia”, com “a exigência que você faça um roteiro de 80 páginas, que tenha 300 mil papéis para mostrar”, referindo-se aos editais de incentivo, “uma coisa mantida por pessoas que, pelo amor de Deus, nunca foram representativas do ponto de vista do cinema de criação”, opinou com sua notória sinceridade em uma entrevista ao jornal O Globo, em 2015, por ocasião da abertura da mostra em sua homenagem e lançamento do documentário Rosemberg 70 — Cinema de afeto, de Cavi Borges e Christian Caselli.
Expoente de um cinema que ele considerava “de invenção”, Luiz Rosemberg Filho irritava-se com a expressão “cinema marginal”. “Acho escroto!”, esbravejava. Definia o seu cinema como uma “revolução estética necessária que rompesse com a linguagem tradicional de Hollywood. É um nome malicioso para denegrir a imagem de quem lutou por um cinema não oficial. É uma terminologia inventada pelos merdas que precisam de rótulo. Muito amador.”
Sua grande paixão, sempre paralela ao seu trabalho de cineasta, eram as colagens, que ele fazia tanto como “uma terapia para não enlouquecer”, como “para refletir sobre o que poderia fazer com imagens.”
E Luiz Rosemberg Filho fez muito como as imagens para cinema brasileiro. Ele faleceu nesta madrugada de domingo, aos 76 anos. Encantou-se com uma nova invenção de cinema.
O cineasta fotografado Pedro Kirilos em sua casa, 2015, ao lado de fotos, colagens e lembranças.

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