Meu querido Andrade Junior, a penúltima vez que nos vimos foi em setembro do ano passado, lembra? Na avant-première do documentário sobre Gê Martú, O mestre da cena. O pouco que conversamos foi muito: muito é qualquer mínimo de você, qualquer riso é gargalhada, qualquer “oi” é uma louvação, qualquer abraço é uma celebração.
A “Indesejada das gentes” chegou hoje nesta manhã de sábado. Veio essa tal de inexorável de algum canto e subiu a via contra o sol em direção a Sobradinho, e silenciosa adentrou seu coração, não aguardou seu café, não viu “a mesa posta / com cada coisa em seu lugar.”*
Você brincalhão como sempre, deve ter dito “Alô, iniludível! / O meu dia foi bom, pode a noite descer”*, como se fosse mais um take de um dos tantos curtas que você fez na “brodagem” para nós, cineastas sem grana de edital, com um roteiro na mão e uma câmera na cabeça, ao contrário do que pregava Glauber.
Mas “a noite com seus sortilégios”* não adiou a viagem, encontrou “lavrado o campo” dos seus dias, “a casa limpa” de sua vida, e seguiu com você para além das ruas de Sobradinho, tomou rumo ignorado na imensidão de outras cidades satélites nos céus.
A última vez que o vi, caro onipresente Andrade Junior, foi há pouco no hall do cine Brasília, com tantos que lhe esperavam para o último olhar, você ali, “deitado como nunca / com seu sapato e seu nariz em riste” **. Ainda tão-Andrade naquele corpo, parecendo que a qualquer momento saltaria numa gargalhada, e diria “foi brincadeira, pessoal!”, e nos chamaria para uma cerveja lá fora.
Mas nem sempre a vida é filme, e a Indesejada, “não sei se dura ou coroável”*, cristalizou sua ausência no salão do seu cine Brasília.
Tornamo-nos eternos no coração de quem nos quer bem. Você agora é para sempre, Andrade Junior.
(Versos dos poemas *“Consoada”, de Manuel Bandeira”, e um meu,** “O morto”)
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