No dia 4 de agosto de 1895, o compositor, pianista, organista e regente cearense Alberto Nepomuceno realizou um concerto histórico no Instituto Nacional de Música, no Rio de Janeiro, com um repertório de canções de sua autoria. Houve uma reação imediata na imprensa. Consideravam que a língua portuguesa era inadequada ao bel canto, termo relacionado ao canto italiano. O pianista e crítico Oscar Guanabarino foi quem mais implicou. Alberto Nepomuceno manteve sua posição e sustentou o embate. Nesse período que cunhou a frase: “Não tem pátria um povo que não canta em sua língua”.
O músico soube com grandiosidade empregar a síntese de influência e ecletismo. Maxixe, lundu, ritmos africanos, estão presentes em suas criações, assim como habanera, tango e polcas. Compôs em 1887 o batuque Dança de Negros, uma das primeiras com motivos étnicos. Precursor do nacionalismo musical, Nepomuceno é o mais consistente nome na virada de concepção da música brasileira do século 19.
Em 1916 sofreu um grande desgosto: a anulação arbitrária, por parte do governo do presidente Venceslau Brás, de um concurso na Escola Nacional de Música, que presidia há mais de dez anos. Em conflito com a instituição, subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, demitiu-se. E afastou-se dos palcos. Estava separado de Walborg Bang, pianista norueguesa, que conheceu em viagem à Europa, casaram-se em 1893 e tiveram quatro filhos. Com sérias dificuldades financeiras e muito adoentado, foi morar na casa do amigo Frederico Nascimento, violoncelista português, no bairro de Santa Teresa.
Nepomuceno “embranqueceu, tinha o olhar adormecido e os seus amigos viam, aflitos, que caminhava a passos largos para a morte”, conta Luiz Heitor de Azevedo, em seu livro 150 anos de música no Brasil (página 173, edição de 1956). Os passos chegaram rápido na noite de 16 de outubro de 1920. O professor Octavio Bevilacqua, sentado ao seu lado no leito final, emocionou-se ouvindo-o cantar sua última e inconclusa canção composta sobre o poema A jangada, do conterrâneo Juvenal Galeno. Os versos tornaram-se um imperceptível sussurro, substituídos vagarosamente por derradeiros suspiros: “Minha jangada de vela / que ventos queres levar? / Tu queres vento de terra, / ou queres vento do mar?”...
Alberto Nepomuceno tinha apenas 56 anos quando embarcou nessa jangada, simbolicamente em direção de volta ao Ceará. Foi sua última regência “no meio das ondas / nas ondas verdes do mar”.
Foto de autor desconhecido, provavelmente 1911, Acervo Alberto Nepomuceno / Coleção Museu do Ceará.
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