Em toda obra da inglesa Virginia Woolf, Orlando: uma biografia se destaca por ser considerado um dos livros mais acessíveis em estilo, narrativa e temática semi-biográfica, baseado em parte na vida da amante da escritora, a romancista e paisagista Vita Sackville-West.
Sobre a relação, a jovem cineasta britânica Chanya Button dirigiu em 2018 o drama biográfico Vita & Virginia (no Brasil, Um romance nas entrelinhas), onde mostra mais diretamente as conflagrações do romance entre as duas escritoras e como gerou um dos mais emblemáticos livros na literatura modernista.
Em Orlando, Virginia Woolf, com uma impressionante beleza de escrita, discute as ambiguidades da similitude feminina e masculina e seus conflitos com a condição humana. Com um humor elegante, a história discorre o significado da imortalidade da personagem, uma espécie de “Hightlander vitoriana”, que atravessa 350 anos no tempo da história britânica. Em 1992 a cineasta inglesa Sally Porter fez uma adaptação à altura, Orlando, com a ótima atriz Tilda Swinton, papel que lhe deu projeção mundial no cinema.
Em 1989, Bia Lessa fez uma extraordinária adaptação de Orlando para o teatro, com Fernanda Torres no papel. Remontou a peça em 2004, com Betty Goffman substituindo.
A literatura de Virginia Woolf é um desafio para a linguagem cinematográfica, mesmo assim as adaptações feitas demonstram propriedade e uma leitura implícita das imagens que a autora coloca em suas páginas. Mrs. Dalloway, romance histórico de 1925, foi filmado em 1997 por Marleen Gorris, com Vanessa Redgrave no papel da fictícia socialite pós-Primeira Guerra. O livro em si é um dos pontos principais, quase como um personagem, na cinebiografia que o cineasta Stephen Daldry dirigiu em 2002, As horas, baseado no original de Michael Cunningham, onde mostra a existência de três mulheres de gerações diferentes: a editora Clarissa Vaughan (Melry Streep), a dona de casa Laura Brown (Julianne Moore) e ela, Virginia Woolf (Nicole Kidman), cujas vidas são entrelaçadas pelo romance que esta tenta escrever, Mrs. Dalloway.
Ao farol, drama introspectivo em paisagem insular, que Woolf descrevia como “facilmente o melhor dos meus livros”, de 1927, teve uma adaptação pouco conhecida, feita por Colin Gregg para a televisão britânica, em 1983.
Entre romances, ensaios e contos que Virginia Woolf escreveu, considero As ondas, de 1931, que não foi filmado, um dos mais inventivos enredos enquanto narrativa. É sua obra mais experimental. Uma maravilha! Os solilóquios de seis personagens (ou seriam vozes?), se alternam em conceitos individuais e de comunidade, do ser e de todos, do eu e do outro. Um caleidoscópio de índoles, traços psicológicos que vão de encontro à consciência de quem narra, de quem é narrado e de quem lê.
No começo dos anos 20 Virginia Woolf frequentava a Garsington Manor House, um extenso edifício em Oxfordshire, sudeste da Inglaterra, que a aristocrata e proprietária Lady Ottoline Morrell transformou em ponto de encontro de intelectuais famosos, como Aldous Huxley, T. S. Eliot, D. H. Lawrence, principalmente durante a Primeira Guerra, servindo o lugar como refúgio, além de outros imóveis da anfitriã das artes. Amante de alguns, como o filósofo Betrand Russell, Lady Morrell foi patrona influente de muitos escritores.
Falecida em 1938, seus diários, cadernos, cartas e fotografias desse período de convivência com seus protegidos, estão hoje guardados na Biblioteca Britânica. Relatos e fotos de Virginia Woolf fazem parte desse precioso acervo. A foto acima, em frente ao prédio, feita por Lady Morrel, é de 1923. Virginia Woolf tinha 41 anos e acabara de lançar o romance O quarto de Jacob.
O começo da Segunda Guerra Mundial, a destruição da sua casa em Londres durante uma busca, a fria recepção da crítica a sua biografia escrita pelo amigo Roger Fry, tudo veio em ondas para Virginia Woolf depois desse tempo em Garsington.
Na manhã de 28 de março de 1941, então com 59 anos, a escritora encheu de pedras os bolsos de seu casaco e foi ao encontro das águas profundas do Rio Ouse, perto de sua casa, em North Yorkshire. Foi encontrada três semanas depois, por um grupo de crianças.
"O que quero dizer é que te devo toda a felicidade da minha vida. Fostes inteiramente paciente comigo e incrivelmente bom."
Trecho da breve e comovente carta que deixou para ao marido, Leonard Woolf.
Como Orlando, Virginia Woolf atravessa o tempo na história da literatura e em ondas na nossa memória.
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