Ô Antonico,
- Samba Antonico, de Ismael Silva, 1950.
O compositor niteroiense, criado no bairro Estácio de Sá, Rio de Janeiro, sempre desconversou quando lhe perguntavam se a letra era autobiográfica.
Ismael, que faleceu em 1978 aos 72 anos, passou sérias dificuldades financeiras por quase vinte anos, quietinho, sem falar para ninguém, no anonimato de aceitação e constrangimento. Até 1930, vivia bem, vendia seus sambas para Francisco Alves e Mário Reis, várias parcerias com Noel Rosa, além de ser gravado por Silvio Caldas, Carmen Miranda e Aurora Miranda. Criou, a partir de um bloco carnavalesco no Estácio, a primeira escola de samba carioca, a Deixa Falar, em 1928. O rompimento com Chico Alves, a morte de dois grandes amigos parceiros de boemia e composições, desilusões amorosas, a prisão em flagrante, por três anos, por tentativa de homicídio, deixaram Ismael pra baixo. Ao sair da cadeia, vai morar de favor na casa da irmã e se isola da vida artística.
Somente em 1950 Ismael levanta-se, procura os antigos companheiros de música. Antonico é a primeira composição dessa fase de retorno. Por isso, nos versos os contornos de uma situação à procura de trabalho. Muitos historiadores registram que Pixinguinha, por volta de 1939, ao ver o estado de penúria do colega, escreve uma carta ao amigo musicólogo Mozart de Araújo, relata as qualidades como sambista e finaliza dizendo “Espero que o que puder fazer pelo Ismael seja como se fosse por mim.”
O autor grava a música em 1953, mas foi graças à interpretação do cantor Alcides Gerardi, dois anos antes, que Antonico estoura nas rádios e vende milhares de discos. E seguem dezenas de outras composições do sempre elegante Ismael, nos anos 50 e 60, nas vozes de famosos como Dolores Duran, Ataulfo Alves, Donga, Aracy de Almeida, no violão de Baden Powel, na flauta do carinhoso missivista solidário Pixinguinha.
Ismael regrava sua emblemática composição em 1973. Foi nessa década que cantores como Chico Buarque, Caetano Veloso, Elza Soares, o grupo MPB-4, reverenciaram o compositor em shows, cantando seus sambas. É de Gal Costa uma das gravações mais conhecidas de Antonico, no show Fa-tal - Gal a todo vapor, em 1971, no Teatro Ruth Escobar, São Paulo, que praticamente apresentou Ismael para as novas gerações.
Parte de nossa rica música brasileira faz aniversário hoje: 115 anos de nascimento de Ismael Silva. Com ou sem o alter ego "Nestor" da letra, ou a boa vontade de "Antonico" na pessoa de Mozart de Araújo, o compositor deu a volta por cima, porque desde que o samba é samba, ninguém faz o que ele fez.
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