ilustração Leonardo Kayo
Um homem com uma dor
É muito mais elegante
Caminha assim de lado
Com se chegando atrasado
Chegasse mais adiante
Carrega o peso da dor
Como se portasse medalhas
Uma coroa, um milhão de dólares
Ou coisa que os valha
Ópios, édens, analgésicos
Não me toquem nessa dor
Ela é tudo o que me sobra
Sofrer vai ser a minha última obra.
Poema de Paulo Leminski publicado em La vie em close, livro póstumo organizado por Alice Ruiz, 1991.
Além dos poemas inéditos, textos publicados em jornais e revistas nos anos 70 mostram e reforçam a característica do autor em uma linguagem extremamente articulada e musical.
Falecido em 7 de junho de 1989, aos 44 anos, Leminski dedicou-se aos escritos logo após a edição de Distraídos venceremos, 1987. Sabia que não tinha muito tempo pela frente, a cirrose hepática se agravava. Mas o poeta não se abatia. "Não discuto com o destino / o que pintar eu assino", disse no curto poema de resignação lúcida do eu-lírico.
Como uma entrega às horas, em cada palavra, cada verso, cada poema, ele focava a vida e extraía a sua substância, aproximava-se o máximo que podia do seu íntimo.
O poema do samurai com uma dor assim de lado foi musicado por outro elegante que sempre chegou adiante, Itamar Assumpção, gravado em seu último disco Pretobrás - Por que que eu não pensei nisso antes?, 1998.
A vida em close nos dois amigos e suas últimas obras.
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