Repostando para sempre lembrarmos dos grandes nomes da literatura brasileira. Este país é também inteligência, beleza, coragem. E não podemos sucumbir à barbárie institucionalizada.
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A poeta, contista, romancista e tradutora Olga Savary, que faleceu em 15 de maio do ano passado, e hoje faria 88 anos, demorou duas décadas para escrever, organizar os poemas e decidir publicar seu primeiro livro, Espelho provisório, em 1970. E só o fez por insistência dos amigos Ferreira Gullar, que prefaciou, Nélida Piñon, Ziraldo, o pintor e gravurista Carlos Scliar, que a desenhou na capa como um croqui Modigliani, Antonio Houaiss, e do cartunista Jaguar, com quem foi casada.
Eles persistiram e venceram a timidez de Olga, aos 37 anos, em “se expor”. São poemas muitos deles publicados a varejo, com o pseudônimo de Olenka, em jornais de Belém, sua terra natal, Belo Horizonte, e Rio de Janeiro, onde vivia desde 1942, vindo de Fortaleza, onde morou por seis anos. Amigos e cidades espelhadas.
Editado pela José Olympio, as páginas são em papel de delicadeza rudimentar, um pergaminho afetivo. A segunda e terceira capas (orelhas) sem nada escrito, ouvindo o silêncio de quem lê. A quarta capa toda branca, sem foto, nem, claro, o sistema de identificação dos códigos de barra com ISBN - criado em 1969, oficializado em 1972, e obrigatório em 2003 -, não há nada, só o vazio como a lembrança preenchida por um poema que se encantou. Molduras do espelho.
São 88 belos poemas divididos em duas partes, Pássaros da memória e Nada termina tudo se renova, em 124 folhas que se espraiam no tempo da autora, nas datas em que nasceram, nas cidades onde os sentimentos dos versos foram cartoriados. Rio, nov, 1951, Belém, março, 1952, Rio das Ostras, abril, 1969... assim Olga registra no final de cada poema, o que nos faz imaginar o chão de um lugar do passado em que a poeta pisou com seu coração. Luzes espelhadas.
Espelho provisório ganhou o Prêmio Jabuti 1971 na categoria Autor Revelação. Até 1998, quando publicou seu último livro, Repertório selvagem, poesia reunida, mais de 20 títulos iluminam a vida de Olga Savary, além de identificar seu pensamento nas traduções que fez de Pablo Neruda, Jorge Luis Borges, Cortázar, Carlos Fuentes, García Lorca, Mário Vargas Llosa, e tantos outros da literatura hispânica, e também dos mestres do haicai, Bashô, Buson e Issa. Reflexos do espelho.
Nesse seu primeiro livro há uma das mais belas dedicatórias que já li: “Para Bruno Savary, meu pai, amigo de infância”. O espelho definitivo da poeta.
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