O sol por testemunha (Plein soleil), produção
franco-italiana de 1960, dirigida por René Clement, é um dos melhores filmes de suspense da história do cinema.
A trama armada ao longo da narrativa, em ritmo crescente,
nos tornando "cúmplices" dos planos do personagem
principal, é um exemplo de como se faz um bom filme de suspense.
E suspense aqui não tem nada, nada vezes nada, a ver com sustos explícitos que
esses estultos roteiristas de Hollywood "criam" nesses filmecos de
shopping.
Na obra-prima de René Clément, que hoje completam 19 anos de
sua morte, o suspense compactua com o voyeurismo de quem assiste, que é uma
característica da relação cinema-espectador. Acompanhamos a história, e em
algum momento nos pegamos a favor, mais do que contra, da personalidade dos
personagens. Contextualizados que estamos no filme, nos flagramos e nos
espantamos com comportamentos que escondemos à luz do dia
lá fora. No escurinho do cinema, nos confrontamos com nossas mais secretas disponibilidades para isso ou
aquilo. Tanto quanto entretimento, cinema é reflexão. Mesmo rindo, mesmo lacrimejando, mesmo se assustando. Mas o filme tem que ser Cinema, e não um "filme"
tão somente.
Em O sol por testemunha, a segura direção e as
afinadíssimas atuações de Alain Delon, Marie Laforêt e Maurice Ronet, concretizam de maneira irretocável um roteiro bem construído, uma estrutura de
narrativa clássica de suspense psicológico. O filme inspirou Roman Polanski a
fazer o seu primeiro longa, o igualmente ótimo A faca na água (Nóz
w wodzie), rodado na Polônia, em 1962.
Naquele começo de década, o cinema
francês reinventava os códigos da linguagem cinematográfica através da nouvelle
vague, e mesmo sem estar inserido na nova onda, Clément não se situa à margem
por sua compreensão e inteligência atemporal.
Não por acaso, o diretor de fotografia, Henri Decaë, fez um ano antes Os incompreendidos (Les quatre cents
coups), de François Truffaut.
O sol por testemunha é baseado no livro O talentoso Mr.
Ripley, de Patricia Highsmith, título da refilmagem feita por Anthony Minghella,
em 1999, com Matt Damon e Gwynett Paltrow. A diferença é enorme. Sem comentários.
E o personagem continuou se propagando, ou se diluindo, em continuações mais-do-mesmo: até a respeitada cineasta italiana Liliana Calvani dirigiu sob encomenda, em 2002, O retorno do talentoso Ripley (Ripley games), e o sempre encomendado Roger Spottiswood ousou um tal de Ripley no limite (Ripley under ground), em 2005. O cinema é testemunha do que fazem com esses remakes.
Em tempo: Patricia Highsmith também foi adaptada por Alfred
Hitchcock, em 1951, com o excelente
suspense Pacto sinistro (Strangers on a train). Cinema!
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