Em um trecho da entrevista concedida ao jornalista Joel Silveira, na Livraria José Olympio, no Rio de Janeiro, em 1948, Graciliano Ramos disse que "Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer."
Essa e muitas outras entrevistas, com enquetes e depoimentos, estão reunidas no livro Conversas: Graciliano Ramos, organizado por Thiago Mio Salla e Ieda Lebensztayn, publicado pela Editora Record, em 2014. Os autores compilaram um riquíssimo material de 1910 a 1952, dando um painel da vida pessoal, intelectual e política do grande escritor alagoano.
A precisão da palavra na obra de Graciliano é definição desse pensamento pontuado na entrevista.
Graciliano está para a prosa assim como João Cabral de Melo Neto para a poesia. A síntese da palavra, a palavra certa na síntese, é o ouro verdadeiro que brilha em seus livros. A secura de sua literatura não é aridez, é concisão, é métrica em diálogos, é a dissecação dos sentimentos dos personagens e desenho definido dos conflitos, sem rodeios, a fundo. Graciliano é um minimalista do sertão, se destitui de excessos para fixar no âmago. Por isso sua palavra diz.
Vidas secas, publicado em 1938, por exemplo, é uma espécie de romance-haicai, pelo texto e os diálogos sincopados. E essa objetividade e determinismo do escritor, faz o leitor partícipe do destino daquela família de retirantes.
Assim como o romance citado, todos os livros de Graciliano têm essa beleza e esse olhar determinado da escrita. São Bernardo, Angústia, Caetés, Insônia, os memorialistas Infância e Memórias do cárcere, tudo, até mesmo a bela obra de correspondências, Cartas de amor à Heloísa, é de um esplendor poético impressionante pelo rigor das palavras.
Comemora-se hoje no Brasil o Dia do Escritor. A data foi escolhida em 1960 durante o 1º Festival do Escritor Brasileiro, criado pelos integrantes da presidência da União Brasileira de Escritores, João Peregrino Júnior e Jorge Amado. O potiguar Peregrino Júnior, médico de formação, foi jornalista, autor de romances e livros em sua área acadêmica. O escritor baiano já tinha mais de dez obras publicadas, e foi o que mais manifestou, com a iniciativa do evento, sua preocupação em garantir maior visibilidade ao profissional de letras. O então ministro da Educação e Cultura da época, Pedro Paulo Penido, no governo Juscelino Kubitschek, oficializou a data por meio de uma portaria publicada dois dias antes do dia escolhido.
25 de julho, de Graciliano nas margens das águas alagoanas, da Bahia de todos os santos de Jorge Amado, das terras sem fim de todos os escritores brasileiros, hoje é dia também das lavadeiras, que nos ensinam tão bem a escrever.
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