"A vida vem em ondas, como um mar..."
sábado, 31 de dezembro de 2011
o filme
"Mãe e filha", segundo longa do cineasta cearense Petrus Cariry,
foi o melhor filme que assisti em 2011. Ainda não lançado no circuito
comercial, o belo trabalho foi apresentado em vários festivais nacionais
e internacionais, ganhando merecidos prêmios em diversas categorias.
Petrus é de uma geração de cineastas ousados, que não fazem concessões e
vão na contramão da mesmice, como Erik Rocha, Cláudio Assis, Karim
Aïnouz... Mas, sem desmerecer de forma alguma o talento desses e de
outros poucos, Petrus é o mais autêntico. Sempre digo que ele não faz
filmes: faz Cinema.
Algumas observações do Olhar
o disco
“Que isso fique entre nós”, do paulista Robson Pélico,
ou somente Pélico, foi o melhor disco de 2011. Inquietou-me e me
confortou com suas letras certeiras, sua musicalidade longe da mesmice
"pop”. Ele tem outro cd, de 2008, “O último dia de um homem sem juízo",
mais guitarra, mais gritante. Mas esse segundo é O disco.
Pélico é um Luspicínio redivivo, um Roberto meio bossa-nova, meio rock-and-roll.
Pélico vai direto nos corações sofridos, nas relações findas, e não se
desespera: fotografa com sua voz grave e ao mesmo tempo delicada o que
às vezes escondemos, o que nem sempre relevamos, e ele nos revela com
sua enorme gratidão poética.
Em 2012 ele precisa se estender
mais em shows além da "cena paulista". Aguardo, aguardamos você, Pélico,
Brasil a fora! Que isso não fique só entre nós.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
você ainda é uma garotinha
Era tarde de um sábado de dezembro, há dez anos. Cheguei em casa e encontrei Cris
chorando diante da tv acompanhando a notícia sobre Cássia Eller. E não
acreditei, ou não quis acreditar, como sempre acontece quando nos
deparamos com a morte de um artista. Como a arte é eterna, queremos
sempre nos iludir que seus criadores sejam igualmente para sempre.
Quando vim morar
em Brasília, já conhecia e gostava da música da Cássia, mas confesso
que realmente passei a ouvir e gostar da Cássia junto juntinho com Cris,
ainda no vinilzão , o que tem “Por enquanto”, do Renato Russo, em que
ela está chutando lata na contracapa, e nos tempos dos shows soltos e
aconchegantes do Bom Demais, na 706 Norte.
Valeu, Cássia, pela sua música! Você ainda é uma garotinha.
Valeu, Cris, por ser minha musa! Você continua minha garotinha.
terça-feira, 27 de dezembro de 2011
então foi Natal
Passei
esses dias natalinos no interior de Minas, no sertão verde roseano. Não
tão "sem rádio sem notícia das terras civilizadas": de algum lugar
vinha o mantra da Simone lembrando "então é Natal"...
Em 1995 a
cantora Simone gravou um cd com doze faixas só com temas natalinos. É
um disco cheio de versões de clássicos como o de Irving Berlin, "White
Christmas" e "Silent Nights" de F.
Gruber, respectivamente "Natal branco" e "Noite feliz", além do "Jesus
Cristo" de Roberto Carlos e "Boas Festas", do grande Assis Valente.
Mas o que ficaria mesmo marcado é a terrível versão de "Happy xamas/Was
is over", de John Lennon e sua Yoko Ono, feita por Cláudio Rabello, por
aqui intitulado "Então é Natal". Todos conhecem. Trilha sonora de
shopping e principalmente de supermercados enquanto se escolhe o peru
mais em conta pra ceia.
Essa música não para de tocar. O disco vendeu mais de um milhão de cópias, e garanto que não contribuí pra essa cifra.
A música do ex-beatle é sobre a guerra do Vietnã, e usa o Natal como
uma representação de final de ano, quando todos se mostram alegres e
cordatos (o "espírito natalino"!), mas, na verdade, fica a pergunta que
não quer calar: "And what have you done?". Pensa-se no aspecto
comercial, no religioso, mas não na essência da mensagem de resistência
pacífica daquele Cristianismo com o qual John, mesmo sendo ateu, se
identificava. Versões como essa "Então é Natal", pela falta de
conhecimento da língua inglesa e até mesmo por falta de talento, é um
verdadeiro esquartejamento poético das obras.
E essa versão "simonética" já roda há tantos natais que eu achava que fosse bem antes de 1995.
segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
o inventor de palavras
Tenho
uma dificuldade enorme de escrever poemas dedicados à pessoas,
locais, acontecimentos, datas - que dirá "poemas encomendados"... É o que diz o Drummond, em seu claríssimo "Procura da poesia".
Às vezes me descuido e cometo alguns versos em devotamento, em
consagração. Na verdade, me desculpo justificando o afeto em que se
encerra às pessoas queridas.
Hoje é aniversário do poeta Manoel de Barros, 95 anos. Assim como
Drumond, Bandeira, Gullar, Pessoa, Whitman, Régio, Cecília, Quintana... devo
muito a ele, pela poesia que me invade a vida. Esse poeta, nascido à
beira do rio Corumbá, sabe como pouquíssimos reinventar as palavras, dar
significado tão profundo às insignificâncias do dia a dia. Seus livros
devem estar sempre ali, ao alcance da mão, para uma releitura, como
primeiros socorros quando nos perdemos em devaneios desnecessários no
nosso cotidiano.
O cineasta Pedro Cezar fez um belíssimo
documentário, "Só dez por cento é mentira", lançado ano passado, onde
encontramos uma espécie de "biografia inventada" do poeta matogrossense.
O "inventada" é mais uma das saudáveis brincadeiras do poeta com as
palavras. O filme é narrado com depoimentos de leitores, familiares,
leitura de poemas, e conversas do próprio poeta, o que nos deixa mais
cativados pela grandeza em sua simplicidade.
Então, como às
vezes me descuido e cometo versos declarando-me a quem amo, eis aqui o
que escrevi ao Manoel, há alguns anos, e coloquei no meu livro "Poesia
provisória".
terça-feira, 13 de dezembro de 2011
Seu Luiz é pop
foto Arquivo NV
Hoje
Luiz Gonzaga faria 99 anos. Os cadernos cês dos jornais
estão tecendo homenagens, chamando-o de “pop”. Pop de popular, ou seja
lá o que isso signifique, o velho Lua sempre foi um dos meus ídolos.
Não cresci ouvindo João Gilberto, Chet Baker e Leonard Cohen,
santíssima trindade, entre tantas outras, que
venero e escuto quase diariamente. Cresci ouvindo Gonzagão, Roberto
Carlos, Reginaldo Rossi... e até mesmo antes dos Beatles, as versões
enviesadas de Renato e Seus Blues Caps. Eu fui Jovem Guarda: Tropicália
depois. Eu ouvia Cego Aderaldo: Robert Johnson, Muddy Waters, John Lee
Hooker tiveram que esperar a rabeca terminar o ronco no meu sertão.
Esses músicos igualmente ótimos, a gente conhece depois, quando se sai
dos bairros periféricos, vai-se morar num apartamentozinho melhor e
passa-se no vestibular. Por um tempo sentia-se vergonha de
gostar de baião, cantar “Detalhes” pra amada amante, e de ouvido
pegava-se carona no radinho da empregada dizendo pro garçon que “no bar
todo mundo é igual”... Eu nunca dei a mínima pra isso, nunca me
importei com o que achavam ou perdiam. Assumia meus erros, pecados e
vícios.
Uma vez um amigo, nos final dos anos 70, apertou o play do
meu toca-fitas CCE e ao ouvir o Rei cantando “Cavalgada” passou o resto
da tarde curtindo com a minha cara. Mandei-o embora cantar “Amor de
índio”, do Beto Guedes, que ele achava o máximo – e eu também.
Luiz
"Lua" Gonzaga sempre foi ídolo a altura de todos outros que hoje são
"cult”. A primeira vez que assisti a um show do Gonzagão me emocionei
tanto quanto ao ver e ouvir B. B. King. Entre o Rio São Francisco e o Rio
Mississipi a distância é a mesma em que navega meu coração.
A benção, seu Luiz!
a luz dos olhos teus
foto Arquivo Pessoal
Hoje é dia de Santa Luzia. A
imagem dessa Santa é uma das mais fortes lembranças da minha infância,
em Crateús, interior do Ceará, onde nasci e fui criado.
Minha tia era
devota e na parede do quarto onde eu dormia, era a primeira imagem que
via ao acordar: batia um facho de luz que vinha
de alguma telha quebrada. Nada mais sintomático: a jovem santa
siciliana é protetora dos olhos, da visão, da luz.
A minha impressão
era que a Santa me abençoava a manhã, com a oferenda do par de olhos na
bandeja.
Casa desfeita, parentes idos, herdei esse quadro e a
saudade. Coloquei-o na cenografia dos meus dois primeiros
curtas-metragens. Afinal, cinema precisa de luz.
quarta-feira, 7 de dezembro de 2011
a estética da cosmética
"A
prisão estética em que o jornalismo da Globo está envolvido é tão
grande, que eu não vejo forma alguma de fazer um trabalho bem feito: não
há condição, porque há um problema não só político, é um problema
estético. Isso eu acho uma coisa grave. Quero dizer que a censura
estética é mais grave do que a censura política, e é terrível que as
pessoas não se apercebam disso!"
Cineasta Eduardo Coutinho, em entrevista em 2003, atualissimo nestes tempos de "viuvez" de Fátima Bernardes.
Coutinho, juntamente com outros cineastas, João Batista de Andrade e
Paulo Gil Soares, dirigiram de 1975 a 1984, programas para o Globo
Repórter. As imagens eram captadas em 16mm, tinham uma linguagem muito
própria do cinema e uma surpreendente liberdade editorial.
segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
na trilha de Nino
Video enviado pelo artista plástico e cartunista João Alberto Lupin para minha página no Facebook. O conterrâneo Lupin sempre me "provoca" com essas ótimas postagens de cinema.
Nino Rotta é um dos meus preferidos
compositores de trilha sonora para cinema. Ele traduziu muito bem em
música as imagens de Visconti, Monicelli, Coppola, Dmytryk,
Zeffirelli... mas foi com Federico Fellini que ele fez a mais perfeita tradução.
É
dificil assistir Fellini sem Nino Rotta. Como ouvir Nino Rotta dá
vontade de ver Fellini.
Aqui trechos de temas dos filmes "A estrada da vida", "Amarcord", "Os palhaços", "Oito e meio", de Fellini, e "O poderoso chefão", de Coppola, executados com arranjos do jovem maestro Roberto Molinelli, numa apresentação no Teatro Manzoni, Bologna, Itália, ano passado.
Valeu Lupin! Valeu Nino!
domingo, 4 de dezembro de 2011
doutor futebol
Nunca
fui ligado em futebol. Não entendo nada de futebol. Sou um torcedor
bissexto: de quatro em quatro anos me entusiasmo um pouco pra assistir
aos jogos da seleção brasileira no campeonato mundial.
Mas tenho
admiração enorme por alguns jogadores: Garrincha, Tostão e Sócrates. O
dr. Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira se foi hoje
para outros campeonatos.
sábado, 3 de dezembro de 2011
o futuro em flashback
"Hiroshima,
mon amour", Alain Resnais inovando o cinema em 1959, em direção ao
futuro no mais perfeito uso narrativo de flashbacks.
sexta-feira, 2 de dezembro de 2011
o "lobinho" Keith
O
baixista Keith Richards, quem diria, foi escoteiro. E gostava. Em seus
relatos de sexo, drogas e rolling stones, na autobiografia "Vida", ele
diz que foi uma das melhores coisas que lhe aconteceu quando criança,
no começo dos anos 50, e se tornou membro de uma tal Patrulha do Castor
da Sétima Tropa de Escoteiros. Leu todos os livros de Robert
Baden-Powell, o tenente-coronel do
exército britânico fundador do escotismo, e para o músico era importante
a disciplina para aprender as habilidades de sobrevivência. Keith tinha
até uma barraca no quintal, onde passava horas comendo batata crua,
como "dever de casa".
Certa noite, muitas pedras roladas
depois, já definitivamente um "bad old man", estava sozinho num quarto
de hotel em turnê dos Stones, e assistia pela televisão uma cerimônia
sobre o 100º aniversário do Movimento Escoteiro. Automaticamente, atento
e respeitoso, perfilou-se diante da tv, e com os três dedos na testa
fez a saudação oficial dos escoteiros: "Líder da Patrulha do Castor,
Sétima Tropa de Dardford, senhor!"
Ele achava que deveria se apresentar.
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