Durante o período de 1873 a 1890 o pintor Vincent van Gogh escreveu quase 600 cartas para seu irmão mais novo, Theo van Gogh, um próspero comerciante de arte, com quem compartilhava suas instabilidades emocionais e dele recebia ajuda financeira.
Van Gogh guardou poucas das cartas que recebia, mas o irmão conservou todas. Graças a isso, logo após a morte de Theo, a viúva Johanna van Gogh-Bonger, professora e igualmente comerciante de arte, tratou de publicar algumas dessas correspondências e negociar os quadros do cunhado pela Europa. Ambos faleceram muito próximo, Vincent em 1890, Theo um ano depois.
A obra missivista é uma preciosidade para se conhecer o homem atormentado que foi o pintor. Van Gogh disserta sobre o processo de criação, o seu confronto com os costumes da sociedade burguesa, a sua consciência de se impor como artista e até mesmo – e a expressão substantiva aqui pode parecer contraditória - a lucidez em reconhecer sua loucura, sua crescente perplexidade e agonia diante da vida.
As naturezas-mortas com garrafas de absinto, as florações de um pomar de ameixa, as cortesãs e as velhas camponesas, a solidão dos terraços dos cafés à noite, os velhos tristes no portão da eternidade, os comedores de batata, as cadeiras na sala e o pequeno quarto de dormir, os telhados sobre Haia, o pátio do hospital em Arles, os barcos pesqueiros e o velho moinho, a alma nos auto-retratos, a angústia cinza de seus pinceis e a luz amarela de seus girassóis estão nessas cartas tanto quanto em seus quadros.
É sempre prazeroso reler esses escritos, parece que nos tornamos um dos destinatários. Cartas têm esse poder de acolhimento e cumplicidade. Hábito perdido nestes tempos em que a vida não é mais devagar. Nem divagar.
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