Quando se retirou do cinema, o mundo inteiro ficou vivo nela.
Tinha nascido com outro nome, e graças à sua beleza gélida mereceu ser chamada de Divina, Esfinge Sueca, Vênus Viking...
Meio século depois do adeus, Justo Jorge Padrón, poeta espanhol que falava sueco com sotaque das Ilhas Canárias, estava olhando uma vitrine de uma loja de discos em Estocolmo, quando o vidro descobriu o reflexo de uma mulher alta e altiva, envolta em peles brancas, parada às suas costas.
Ele deu meia-volta e viu a mulher, queixo erguido, grandes óculos escuros, e disse que sim, era, disse que não, não era, que era, que não era, que podia ser, e por pura curiosidade perguntou a ela:
- Desculpe, mas... mas... a senhora não é Greta Garbo?
- Fui – disse ela.
E com lentos passos de rainha, se afastou.
- Esse curioso relato está no livro póstumo de Eduardo Galeano, O caçador de histórias (L&PM Editores, 2016), uma compilação de mais de duzentos ótimos textos curtos, que mesclam relatos de amigos e autobiográficos.
O texto me faz lembrar outra curiosidade em torno de Greta Garbo: a frase “I want to be alone / Eu quero ficar sozinha”. Sempre associada à vida reclusa da atriz, na verdade é de Grusinskaya, personagem que interpretou em O Grande Hotel (Grand Hotel), clássico filme pós-depressão americana dirigido por Edmund Goulding em 1932.
A frase dita pela boca da protagonista, uma dançarina que não crê no amor, marcou como uma sentença a vida de Garbo ao retirar-se do cinema de uma vez por todas nove anos depois, logo após atuar em Duas vezes meu (Two-faced woman), de George Cukor. As críticas negativas ao filme abalaram a estima da atriz, que já se sentia desiludida com o mundo pelos horrores da Segunda Guerra.
Pouco mais de uma década depois, Greta Garbo, mais incisiva pela escolha que fez na carreira artística, afirmou em entrevista à revista Life, na edição de 24 de janeiro de 1955, que "Eu nunca disse que queria ficar sozinha; apenas disse: 'Quero ser deixada em paz'. Há toda uma diferença", imprimindo para si a lenda.
Greta Garbo nunca se casou, não teve filhos, não escreveu livro, e não se sabe se plantou alguma árvore. Também nunca ganhou um Oscar, pelo menos quando foi indicada várias vezes. A Academia com sua mania de tardia "mea culpa", deu a estatueta especial em 1954, celebrando o conjunto de sua obra. A atriz desdenhou da premiação, não compareceu à cerimônia. A pretérita Greta Garbo já estava decididamente recolhida com seu cigarro, objetos de arte, móveis raros e pinturas de mestres impressionistas no gigantesco apartamento da rua 52, em East Side, Nova York, onde faleceu na manhã de 15 de abril 1990, de pneumonia, aos 84 anos.
Acima, a solidão da esfinge fotografada por Cecil Beaton, no Hotel Plaza, New York, 1946.
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