segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Drummond, 120 anos


 foto Acervo Luiz Alphonsus

“que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.”

Trecho de Receita de Ano Novo, que Carlos Drummond de Andrade publicou em 1977 no livro “Discurso de primavera e algumas sombras”.
O poema é apropriadíssimo para celebrar seu aniversário e a eleição de Lula quando o Brasil começa um novo ano.
Drummond, belo como o cometa Halley que ele viu nos céus de Itabira aos sete anos: “Saímos para a rua banhados de ouro, magníficos”, registrou o menino já poeta na crônica "Fim do mundo", publicada em 1962 no A bolsa & a vida".
Em sua homenagem, a presidenta Dilma Rousseff sancionou, em 2015, a data de hoje como Dia Nacional da Poesia.

o dia nasceu feliz!


 

domingo, 30 de outubro de 2022

Lula eleito!


 

indo votar no 13


 Cena de O balão vermelho (Le ballon rouge), de Albert Lamorisse, França, 1956.

13

 


o homem que amava livros


foto Acervo Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, USP

O Dia Internacional do Livro é comemorado em 23 de abril, referência da UNESCO às datas de falecimento de Miguel de Cervantes e William Shakespeare, em 1616. No Brasil, o Dia Nacional do Livro é celebrado hoje, 29 de outubro, em homenagem à fundação da Biblioteca Nacional, em 1810, com a transferência da Real Biblioteca portuguesa para cá.

Reverencio a data ao bibliófilo José Mindlin, criador da mais importante biblioteca privada do país. Quatro anos antes de falecer, aos 95, em 2010, ele doou sua coleção para a Universidade de São Paulo, com mais 30 mil volumes.
“A gente passa e os livros ficam. Então, é preciso que esse conjunto seja mantido e aumentado com o tempo. Sentirei saudades dos livros…”, disse durante a assinatura do termo de doação no auditório do Conselho Universitário.

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

poetas afins



Em maio de 2020, no começo da pandemia, quando passamos a viver necessariamente isolados, a poeta Noélia Ribeiro, pernambucana radicada em Brasília, criou a live A Fim de Poesia em sua página no Instagram.

Assim como muitas outras iniciativas de sobrevivência de corações e mentes, e, cada um em sua casa, ficarmos juntos na esperança de que dias melhores viriam, o programa reuniu, ao longo desses quase três anos, dezenas de poetas na afinidade com a mais íntima das manifestações literárias: a poesia. São autores de todo o país, muitos deles não tão conhecidos, mas que têm trabalhos grandiosos que precisam chegar às pessoas. Esse é um dos méritos das redes sociais, essa é a grande importância dessa live, que se caracteriza por apresentar a poesia dos brasis.
Em 1º de novembro – com este Brasilzão avermelhado de alegria - lerei poemas dos meus livros Poesia provisória (2019) e Trem da memória (2022), publicados pela Editora Radiadora, na luxuosa companhia de Rita Pinheiro (BA), Valmir Jordão (PE) e a regência afetuosa de Noélia, que lerá páginas do recém lançado Assim não vale (Arribaçã Editora, 2022).

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

todo coração

arte Rapha Baggas

 

Nos demais – eu sei,
qualquer um sabe –
o coração tem domicílio
no peito.
Comigo
a anatomia ficou louca.
Sou todo coração –
em todas as partes palpita.

Trecho do poema Adultos, de Vladimir Maiakovski, 1922, publicado em Antologia poética, tradução de E. Carrera Guerra, Editora Max Limonad, SP, 1984 

lavando as palavras


foto: Lavadeiras de Nordeste, autor e datas desconhecidos.

"Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer."

Techo da entrevista de Graciliano Ramos concedida ao jornalista Joel Silveira, na Livraria José Olympio, no Rio de Janeiro, em 1948.
Essa e muitas outras, com enquetes e depoimentos, estão reunidas no livro Conversas: Graciliano Ramos, organizado por Thiago Mio Salla e Ieda Lebensztayn, publicado pela Editora Record, em 2014. Os autores compilaram um riquíssimo material de 1910 a 1952, dando um painel da vida pessoal, intelectual e política do grande escritor alagoano.
A precisão da palavra na obra de Graciliano é definição desse pensamento pontuado na entrevista.
130 anos hoje de seu nascimento.

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

o homem que amou o Brasil - Darcy Ribeiro, 100 anos

 

Nunca o Brasil foi tão amado por um homem só. Nunca o Brasil foi tão brasileiro na existência de Darcy Ribeiro.
Hoje, um século de seu nascimento. O Brasil que segue na página infeliz de nossa história, com a era bozolítica, não é o Brasil que Darcy imaginou. Ele dizia que tinha fracassado em tudo na vida, em alfabetizar as crianças, salvar os índios, fazer uma universidade séria, fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente, mas tinha os fracassos como vitória, pois detestaria estar no lugar de quem venceu. Que no próximo dia 30 de outubro possamos trazer de volta o Brasil de Darcy Ribeiro, e tirar para sempre essa pessoa nefasta, essa alma bissexta do Palácio do Planalto.
Na imagem ilustrativa para esta postagem, o antropólogo com rosto pintado por índios Kadiwéu, em Matogrosso do Sul, 1947, fotografado por Berta Gleizer Ribeiro, também antropóloga e etnóloga, esposa de Darcy, falecida aos 73 anos, nove meses depois dele.

o termo saudade


Hoje, 76 anos de nascimento do cantor e compositor Belchior, que em 2017 ficou encantado com uma nova invenção. De Santa Cruz do Sul, no Rio Grande, pro sertão de Sobral, no rio Acaraú – fazendo o caminho inverso e parafraseando uma de suas canções - se engane não, tem, meu irmão, muito baião de dois lugares e no meio muito chão de história.

A saudade estampada pelos muros do país com o “volta, Belchior” e o seu direito de “deixem que eu decida a minha vida”, fizeram o escritor Ricardo Kelmer organizar e publicar em 2016, pela Miragem Editorial, o livro Para Belchior com amor, reunindo 14 textos de vários autores, inspirados em canções do rapaz latino-americano. Soube-se depois que a publicação chegou às mãos do merecidamente reverenciado. “Leu e gostou”, expressa com alegria e gratidão Ricardo Kelmer.
A tiragem logo se esgotou. Visando uma necessária nova edição, Kelmer e o poeta Alan Mendonça, através da sua Editora Radiadora, organizaram um novo volume. As 96 páginas de 2016 multiplicaram-se em 132 em 2022, com textos inéditos, com mais reverências e referências de 23 autores, que são, de certa forma, alusões, parâmetros e representações da importância poética do cantor na vida de milhares de fãs, admiradores, pesquisadores. O canto torto no que a alma deseja.
O livro foi lançado em agosto na sede da Radiadora, em Fortaleza, e seguiram-se outros lançamentos na capital e em cidades do interior. Belchior revisitando lugares, ouvindo suas canções em diversas vozes, tomando um gole de cerveja em nosso copo e nesses bares, sem deixar o cigarro se apagar pela tristeza.
Hoje, a partir das 19h, celebrando a data, Para Belchior com amor será lançado no Abaeté Boteco, na capital cearense. A banda Nordeste S/A fará um tributo com as clássicas canções do grande cantador das coisas do porão e também da luz, pois como ele bem anunciava, é dia, é de manhã, o sol já vem, here comes the sun. O novo sempre vem, e em cada pessoa, que é maior do que qualquer canto, inaugura-se a vida comovida, inteiramente livre e triunfante. Os cães fascistas da rua não vão nos impedir de sermos felizes, e acabar logo com essa história porca no próximo dia 30.
Participo dessa edição com a crônica Tempos de barbárie dissertando sobre a canção “Baihuno”, parceria de Belchior e Francisco Casaverde. Resgato dos meus arquivos uma premonitória entrevista que o cantor deu ao jornal Correio Braziliense, por ocasião do lançamento do disco homônimo, em 1993. Lembro o meu encontro com ele na cidade, quando segui pelas ilhas cheias de distâncias, que é Brasília, em direção ao show na Sala Martins Pena do Teatro Nacional. Revi e conversei com amigo conterrâneo, que sob as luzes sem medo de nada, cantou e contou histórias talvez iguais as minhas, jovem que também desceu do Norte pra cidade grande.
Até parece que foi ontem sua mocidade.

terça-feira, 25 de outubro de 2022

pelos muros do país


 "...escrevo em letras grandes de novo / pelos muros do país / João, o tempo andou mexendo com a gente, sim"

- Belchior, Comentário a respeito de John, 1979
Rua das Laranjeiras, Rio de Janeiro

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

trindade obscurantista


Uma reflexão urgente, oportuna para os dias atuais que estamos vivendo, ou sobrevivendo, nesse desgoverno, era bozolítica, página infeliz na nossa história.

O texto é do professor de Filosofia Elton Luiz Leite de Souza, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.

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“Espinosa dizia que há uma espécie de “trindade obscurantista” que reduz os homens e as sociedades ao pior deles mesmos, pondo em risco a pluralidade social, a educação e a democracia.
Essa trindade obscurantista é composta pelos seguintes personagens ou tipos: o escravo, o tirano e o sacerdote.
O escravo é aquele que se deixa dominar pelas “paixões tristes”. O escravo não apenas as sofre, o que é natural de acontecer tendo em vista a condição humana, porém ele se alimenta delas, como se isso preenchesse algum buraco em sua vida. O ódio, a ignorância, o medo, o ressentimento... são exemplos de paixões tristes.
Se uma serpente nos morde, é inevitável que em nós entre o veneno, cabendo-nos imediatamente buscar o antídoto. Mas a paixão triste pode fazer do homem um dependente do veneno que o enfraquece, ao mesmo tempo maldizendo quem traz antídotos.
O tirano é quem se vale das paixões tristes para dominar os ressentidos e ignorantes. O tirano canaliza as paixões tristes e as emprega a seu favor, inclusive politicamente. O tirano chega ao poder não por amor à coisa pública, mas tirando proveito das paixões tristes e as fazendo de arma contra os que ele estigmatiza como inimigos.
O sacerdote é aquele que passa a mão sobre a cabeça do escravo, bendizendo a ignorância. Em geral, os sacerdotes são pequenos, e só ficam maiores do que os escravos os mantendo ajoelhados. O sacerdote prega que a tristeza é melhor do que a alegria, que o obedecer é melhor do que o rebelar-se, que filosofia, ciência e arte são perigosas, “demoníacas”...
O tirano escraviza o corpo do escravo, o sacerdote escraviza a alma. “Sacerdote”, aqui, não é exatamente uma autoridade religiosa literal, mas um tipo que se aplica a várias espécies de homens. Espinosa chama de poder teológico-político a essa aliança abominável entre tiranos e sacerdotes, cuja força cresce quanto mais o escravo ignora sua escravidão.
O próprio Espinosa foi perseguido por essa aliança abominável. Tentaram queimar seus livros, bani-lo e até assassiná-lo...
Mas nunca Espinosa se calou diante desses inimigos do pensamento livre e digno. Hoje, mais do que nunca, vale sua perseverante lição: não devemos lamentar ou temer por uma situação adversa, seja ela qual for; devemos buscar compreender as causas que produziram tal situação, para assim mudá-la com a máxima potência que tivermos, nisso concentrando nossos esforços, unindo ideia e ação, não sem o amor e a alegria por estarmos lutando do lado certo.
Esse concentrar de esforços libertários tem um nome: filosofia prática.”

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A imagem ilustrativa acima é reprodução do quadro do maneirista Giuseppe Arcimboldo, Fogo, 1566, que está no Museu de História da Arte em Viena. Não por acaso, é capa do livro Spinoza and the politics of renaturatization, 2011, de Hasana Sharp, professora de História da Filosofia Política da McGill University, Montreal, Canadá.

domingo, 23 de outubro de 2022

começou chorare


A tropical minimalista sincopada canção Acabou chorare, letra de Galvão, musicada por Moraes Moreira, tem uma história interessante.
Gravada no disco homônimo dos Novos Baianos, em 1972, o ano que vivíamos em perigo com a ditadura Médici, o letrista conta na página 98 de sua biografia Anos 70: Novos e baianos, lançada pela Editora 34, em 1997, que um dia telefonou para João Gilberto contando que estava escrevendo uma letra sobre uma abelhinha, a natureza de polinização do doce inseto voador. “Fenomenal!”, admirou o bruxo de Juazeiro, no alto de seu banquinho e violão. E contou ao conterrâneo a coincidência que só o coração pode entender: “Eu estava justamente falando com o poeta Capinan, e ele lembrava que a abelha beija a flor e faz o mel, e eu gostei e completei: E ainda faz zum zum zum”.
- Posso usar isso na minha letra? – Perguntou Galvão.
- Deve – aprovou o mestre.
“Não parou por aí”, continua Galvão, “João contou-me que Bebel, sua filha, quando eles moraram no México, levara uma pancada [...] e ele, preocupado, acudiu com a aflição de pai nessas horas, mas Bebel reagira corajosamente e, na sua inocência de criança, falava uma língua em formação, acalmando-o: Não, acabou chorare.”
E assim, a clássica canção de um dos melhores discos da história da música brasileira, tem o zum zum zum de João e o auto consolo surpreendente de Bebel Gilberto.
O fundador dos Novos Baianos, como disse Jorge Mautner na apresentação do livro Geração baseada (Editora Codecri), que Galvão lançou em 1982, foi um “profeta moderno, batalhador de modernidades e testemunha religioso-social-poética de uma geração importante porque foi a ela entregue o significado de fazer um novo Brasil.”. Desejo tão necessário neste país, neste Brasil pandeiro que vem descendo a ladeira no desgoverno que estamos vivendo.
Desde agosto deste ano, o baiano mantinha em sua página no Facebook o Bazar do Poeta Galvão. Atravessando uma fase difícil, “tem horas que o bicho pega”, justifica-se na postagem inicial, a campanha colocou à venda preciosidades da vida do artista: “Adquira relíquias autografadas pelo poeta Luiz Galvão e ajude nos tratamentos e cuidados que esse gênio da poesia brasileira precisa para levar uma vida digna.”. Com um número chave de PIX, uma das últimas postagens apelava: “Precisamos de você, para acabar chorare e tudo ficar lindo.”
Neste domingo de um outubro tenso, “de manhã cedinho / tudo cá cá cá, na fé fé fé / no bu bu li li...”, nada ficou lindo. Começamos chorare. Internado no início de setembro em um hospital em São Paulo, com suspeita de hemorragia gastrointestinal, o velho novo baiano Galvão faleceu aos 87 anos.
Que as meninas Bebel do Brasil brasileiro que precisamos nos confortem. Urgentemente, abelha abelhinha faz zum zum zum em nosso coração. 

sábado, 22 de outubro de 2022

olhando na mesma direção


O escritor e cineasta Rosemberg Cariry é uma de minhas referências na cultura brasileira. Com seu pensamento de admirável lucidez crítica, sempre conversamos trocando ideias e aumentando os insumos de resistência, como cidadãos e artistas.
Na literatura, criamos, com mais 22 poetas, contistas, romancistas e sonhadores, o Grupo Siriará de Literatura, em Fortaleza, no ano em que ainda vivíamos em perigo, 1979, com o país em convulsão político-social, com a entrada do último presidente do período da ditadura militar, João Figueiredo, e o tremular das bandeiras da abertura política, da anistia, das Diretas Já.
No cinema, fundamos a Associação Brasileira de Documentaristas, seção Ceará, realizamos filmes em Super-8, 16 e 35mm, U-Matic, VHS, o que desse para imprimir a ideia na mão, fazer a hora e acontecer. Fui seu fotógrafo de cena e assistente de direção em curtas, médias e longas-metragens. E ele apoiando sempre em meus filmes e livros.
Em 1986 estávamos no 19º Festival de Brasília de Cinema Brasileiro. Na foto acima, um flagrante da cineasta Liloye Boubli, no restaurante do Hotel Nacional, sede do evento, eu e a atriz Marcélia Cartaxo olhamos curiosos para algo que chamou a atenção de Rosemberg. E quando se trata de Rosemberg Cariry, é sempre algo interessante na linha do horizonte.
A foto, resgatada neste mormaço vespertino de sábado em que escrevo, ilustra muito bem, na simetria do tempo e da esperança, o seu excelente e oportuno artigo publicado no jornal O Povo do dia 19, quarta-feira.
Eu, Marcélia, e todos de espírito libertário, olhamos na mesma direção, caro Rosemberg. Declaradamente.
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O VOTO DECLARADO
Rosemberg Cariry
Há quem me pergunte sobre motivações para votar, em especial os mais jovens. Costumo falar de mim para que não lhes pareça doutrinação. Digo, em primeiro lugar, que sou um ser humano e respeito em profundidade a dignidade e integridade do meu semelhante, bem como os direitos que fundamentam a justiça e a solidariedade entre todos nós. Que voto contra a tortura, a violência, a miséria, a fome, a exclusão social e as desigualdades.
Que habito o planeta Terra e acredito que o equilíbrio entre a vida social e econômica deve considerar a natureza que nos cerca. Que sou contra os destruidores de floresta, os plantadores de desertos, os madeireiros, os mineradores e garimpeiros que envenenam os rios e dos destruidores das culturas e da vida dos indígenas. Que abomino a necropolítica implantada nesse País por pessoas perversas e despreparadas que semeiam ruínas.
Enfatizo que acredito em Deus e acho justas todas as religiões e os seus diferentes caminhos de busca. Que não aceito fanatismo, o uso da religião para disseminação do preconceito e do ódio.
Ressalto que tenho uma grande admiração e respeito pelas mulheres, reconhecendo o seu valor fundamental na vida, na cultura e na sociedade, sendo contrário aos que insultam as mulheres e lhes cerceiam os direitos, promovendo a misoginia. Que tenho respeito pela diversidade de gêneros e apoio as causas das comunidades LGBTQIA+. Assim, sou contra perseguições, deboches, humilhações, violências e cerceamento da liberdade dessas pessoas. Justifico que sou a favor de cotas para negros, pardos, índios e ciganos (entre outros), como reparação histórica.
Sou pela democracia, pela liberdade, pela educação universal, pela valorização da ciência, das culturas e das artes, pelas organizações sociais populares, pela construção de um mundo novo sem ódio, baseado na solidariedade e na justiça.
Por fim, pontuo que por ser nordestino aprendi desde cedo o valor da liberdade. Sou brasileiro e sei o valor da democracia. Sou cidadão do mundo e sei o valor da vida de todos os povos. Assim, para que não guardem nenhuma dúvida, declaro-lhes que voto em Lula.

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

o poeta


- pai, o que é poeta?

os bagunceiros e arruaceiros, filho!
uns sonhadores que rasgam dinheiro
desconcertam a linguagem
na lagoa no lugar do lambari
colocam um violino nadando
no céu o pampa verdejante
na planície o mar azulante
e na lapela um girassol gigante
dizem coisas inesperadas
inventam ritmos alucinantes
às vezes até sem rima
atropelam o alexandrino
contrariam as leis dos sentidos
mais confundem que esclarecem
abusam do mistério
nas suavidades e nas asperezas
da luz sob as transparências
e do vento desenhando com nuvens
formas inexatas de bichos
tornam coisas abstratas
em ideias concretas imprevisíveis
são capazes de transfigurar
qualquer lógica ou limite
para declarar o amor a paz
imprescindível e intransferível
e ao final ainda confessam
que o poema não serve para nada
assim como as auroras as utopias
o perfume das cigarras na hortelã
e a trilha das formigas cortadeiras
no jardim depois da chuva
– papai, quando crescer
posso ser poeta?
Do livro O unicórnio do sul e outras lendas poéticas, de Jose Couto, publicado pela Autografia Editora, RS, 2018, com ilustrações de Luiza Maciel Nogueira.
O lirismo dos poemas e desenhos resgatam a beleza urgente e necessária das lendas, estórias, do lúdico para todas as idades, como encanto e reflexão na contramão destes tempos ditos pós-modernos, no contrafluxo do caos e da esperança, no adestramento tecnológico, no fast food dos afetos.

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

versos em alto mar

Em 1938, o jovem de 24 anos Marcus Vinicius da Cruz de Melo Moraes, o futuro 'poetinha', ganhou uma bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford.
Em setembro daquele ano, a bordo do navio Highland Patriot, escreveu o belamente dolorido Soneto da separação, motivado pela saudade da namorada Tati, que se tornaria sua primeira esposa.
Os versos partem de uma ausência, e não de uma ausência que nos parte quando tudo, “de repente, não mais que de repente”, se faz “triste o que se fez amante”.
Mas por licença poética, e desespero de causa mesmo, se conjuga nas duas ausências... quando se faz “da vida uma aventura errante”. Pronto.
Hoje 109 anos de seu nascimento. Imortal, posto que é chama.

em seu louvor hei de espalhar seu canto


109 anos de nascimento

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

o olhar de Zélia


"Conheci Nirton Venancio há poucos anos, na Livraria Lamarca, em Fortaleza. Foi um encontro acertado pelo editor Silas Falcão, conterrâneo do Nirton e nosso amigo em comum. Percebi estar diante de um sujeito muito afetuoso e muito decente. E foi a partir daí que conheci seu trabalho, como cineasta e como poeta.

Nirton Venancio é um poeta cuidadoso, criterioso, exigente com o que escreve. Por isso surpreende e emociona o leitor com a beleza e a originalidade de cada poema. Penso que Nirton enquanto escreve assume um compromisso consigo mesmo, com o leitor, com a própria poesia. Por isso acho estranho ele ter intitulado de 'Poesia provisória' um livro que, na opinião de muitos bons leitores, é irretocável.
Resultado semelhante ocorre no seu mais recente livro, 'Trem da memória'. Passei meses esperando esse trem, que enfim chegou, carregado de belíssimas memórias, que são do poeta, mas também são minhas e de quem lê esse livro-poema. Porque o leitor vai encontrar ali um pouco de si, da sua história, independentemente de onde ele esteja ou da geração em que se insira, porque a poesia de Nirton Venancio não se limita a essas convenções."
Zélia Sales, contista, no programa Pedagogia da Gestão, na TCM - TV Cabo Mossoró, apresentado pelo escritor Clauder Arcanjo, 15/10/2022
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Poesia provisória, 2019
capa: Fausto Nilo
prefácio: Carlos Emílio Correia Lima
Trem da memória, 2022
capa: Joseph M. W. Turner
prefácio: Valdi Ferreira Lima
posfácio: Mailson Furtado
Publicados pela Editora Radiadora
Coordenação editorial: Alan Mendonça
À venda pelo site www.radiadora.com.br e com o autor.

alto mar

foto Picfair Photography, Dalibor, Croacia

 "Um barco está seguro no porto. Mas os barcos não são construídos para isso."

- John A. Shedd (1859-1928), escritor norte-americano, em seu livro Sal do meu sótão, aforismos,1928.

sábado, 15 de outubro de 2022

outros tempos, outro nível

foto Selmir Yassuda, 1992
 
O Brasil já teve um ministro da Cultura que foi filólogo, escritor, crítico literário, ensaísta, tradutor, diplomata, lexicógrafo, enciclopedista: Antônio Houaiss. Sua gestão, de 1992 a 1993, durante o governo Itamar Franco, teve apoio de artistas e intelectuais de todo o país.

Em seu discurso de posse, Houaiss definiu como prioridades de sua administração a recuperação e a preservação do patrimônio histórico e cultural, a retomada da atividade cinematográfica e um projeto de sustentação da língua portuguesa, por meio do estreitamento dos vínculos com Portugal e com as ex-colônias portuguesas na África.
Imortal, foi escolhido presidente da Academia Brasileira de Letras em 1995, em substituição a Josué Montello. Até o poeta Ledo Ivo, seu adversário na disputa, abriu mão da candidatura na véspera da eleição.
Além dos dezenove livros publicados, foi tradutor do clássico Ulysses, de James Joyce; autor do mais ambicioso e louvável projeto Dicionário da Língua Portuguesa, que tem seu nome; organizou as duas mais importantes enciclopédias feitas no Brasil, Delta-Larousse e Mirador; e assinou a primeira edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP), em 1981.
Outra de suas maiores realizações, e da qual se orgulhava, foi o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, 1990. Com o feito, uniu com precisão as duas carreiras, de diplomata, como membro do serviço exterior brasileiro, e a de linguista.
Falecido em 1999, aos 83 anos, Antônio Houaiss é um extenso verbete de uma página feliz de nossa história. 107 anos hoje de seu nascimento.

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

ele tinha um sonho

MKL Photo

“Digo-lhes hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades e frustrações do momento, eu ainda tenho um sonho.”

- Trecho do célebre discurso de Martin Luther King em frente ao Memorial Lincoln em Washington, no dia 28 de agosto de 1963. Mais de 250 mil pessoas lotaram o espaço e ouviram líderes civis, sindicalistas, religiosos, políticos progressistas e artistas discursarem e cantarem por liberdade, trabalho, justiça social e contra a segregação racial. A luta de Luther King pelo fim da desigualdade através da não violência, e contra a guerra do Vietnã, outorgou-lhe o reconhecimento de liderança.
Em 14 de outubro de 1964, quatro anos antes de ser assassinado, recebeu o Nobel da Paz. Aos 35 anos, foi o mais jovem a receber o prêmio.

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Bandeira do Brasil

 
Foto: Acervo Museu de Literatura Brasileira – Fundação Casa de Rui Barbosa.

Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
- Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
Manuel Bandeira e seu poema-apóstrofe Consoada, publicado em Opus 10, 1952.
A iniludível desceu com seus sortilégios dezesseis anos depois no começo da tarde de 13 outubro. Veio-lhe dura, com uma hemorragia gástrica, aos 82 anos. Mesmo assim, Bandeira não teve medo, o poeta sorria uma carinhosa e consoante evocação. A Indesejada encontrou o campo lavrado em uma vasta obra com cada coisa em seu lugar, coroada com poesia, prosa e traduções.
Otto Lara Resende em uma crônica sobre Bandeira, de 1976, publicada no livro póstumo “O príncipe e o sabiá”, 1994, diz em um trecho que “o melhor da pátria, quem sabe, são os poetas, a quem se fecham todas as portas, para que eles sejam mais livres e vejam mais longe. Sonham Pasárgada.”
Manuel Bandeira foi da geração de 1922 do Modernismo, mas teve desavenças com Oswald de Andrade. Recusou-se a assinar o Manifesto da Poesia Pau-Brasil e chegou a escrever um artigo detonando. Oswald, notório piadista, arriscava perder um amigo, mas não a oportunidade de uma brincadeira. E no embate entre os gênios, teria dito que “um poeta é sempre bem-vindo, e mais bem-vindo se é Manuel, Bandeira do Brasil”.
Chiste ou não, já saudara com distinção o que Lara Resende escreveu com louvor em sua crônica.

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

dia das crianças

foto Olayemi Olatilewa

"Existe algo mais importante do que a lógica: é a imaginação. Se pensamos primeiramente na lógica, não podemos imaginar mais nada."
- Alfred Hitchcock
A imaginação de crianças nigerianas na cidade Naija. Elas fazem cinema com uma ideia na mão e a câmera na cabeça.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

bate outra vez

 
foto Acervo Família Cartola
Há 114 anos nasceu Cartola.
Há 114 anos que as rosas falam na música brasileira.
O mundo é um moinho, este país está um moinho, 'seu' Agenor, estão triturando nossos sonhos. Mas nosso coração sempre bate outra vez com esperança quando ouvimos suas canções.

sábado, 8 de outubro de 2022

O último dia de sol


roteiro e direção: Nirton Venancio]
35mm, PB, 18min, 1999

“O filme é uma belíssima investida no cinema dos sentimentos e da memória. Rosselini redivivo, numa lição despojada de recursos, mas requintadíssima de sinceridade. Nirton Venancio, que havia realizado um poético e emocionante curta-metragem em 1988, 'Um cotidiano perdido no tempo', prossegue revisitando o seu próprio passado com a segurança dos grandes veteranos da Península. ‘Só é moderno aquele que soube ser antigo’, dizia Murilo Mendes. O olhar de Venancio e a luz de Miguel Freire jamais interferem de maneira grosseira na observação adulta dos sentidos aviltados do menino personagem; a opção pelo branco e preto se impõe na tentativa de detectar fragmentos dolorosos da memória de um país à deriva.
‘O último dia de sol’ parece um episódio apócrifo de ‘Roma, cidade aberta’ ou ‘Alemanha, ano zero’. Quem se amarra em firula, vai criticar o final em aberto, o tempo excedente de algum plano e a economia dos diálogos. Os amantes do fetiche vão detestar a decupagem clássica. Mas somente aqueles que odeiam o cinema como meio de aperfeiçoamento humano serão incapazes de enxergar que estão diante de um filme grandioso em sua generosidade. A evolução de Venancio o coloca além do cinema narrativo e mais próximo da poesia em estado seminal.
Eis, finalmente, um herdeiro insuspeito da dramaturgia prosaica, embora universal, e imensa em afetividade, de Roberto Santos.”
- Carlos Reichenbach, cineasta (1945-2011) em sua página Olhos Livres, 2000
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elenco:
Ademir Miranda, Dora Gorovitz, Reinaldo Vieira, Antonieta Noronha, Allyson Amaral, Joca Andrade, Pedro Domingues e mais de 50 moradores de Baturité, Ceará, que trabalharam como figurantes.
direção de produção: Almiro Santos Filho
produção executiva: Magna Mastroianni
direção de fotografia: Miguel Freire
direção de arte: Jefferson De Albuquerque Junior
cenografia: Walmir Azevedo e Fábio Vasconcelos
som: Chico Bororo, Márcio Câmara, Lenio Oliveira
trilha sonora: Eugenio Matos
continuidade: Erika Bauer e Florence Weyne
montagem: Severino Dadá
maquiagem e figurinos: Dami Cruz
assistentes de direção: Joe Pimentel e Luiz Carlos Salatiel
assistentes de fotografia: Sebastian Matias, Carlos Russo, Pedro Rodrigues
fotografia de cena: Galba Sandras e Deise Jefinny
Prêmios:
- Troféu Pinhão, categoria Melhor Fotografia (Miguel Freire), no 4º Festival de Cinema e Vídeo de Curitiba, 2000
- Troféu Eusélio Oliveira, categoria Melhor Direção de Arte (Jefferson de Albuquerque Jr.), 10º Cine Ceará, 2000
- Troféu Jangada, conferido pela Organização Internacional de Cinema (OCIC), categoria Melhor Filme Nacional, 23º Guarnicê de Cine-Vídeo do Maranhão, 2000.
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Exibição:
TV Assembleia Ceará, programa Curta Ceará
9 de setembro, domingo, 21h