domingo, 28 de fevereiro de 2021

apontamentos para um domingo


Belchior tinha 27 anos quando compôs em 1973 “Passeio”, faixa 2 do lado B de seu primeiro disco, lançado em abril de 1974, pela Chantecler, que tem seu nome como título e ficou mais conhecido como Mote e glosa, música que abre o lado A.

Ao som de uma flauta e a cadência de uma percussão que sugerem passos por calçadas, Belchior convida quem o ouve a andar pelas ruas de São Paulo. Ele, que sempre era parado por um guarda em cada esquina e pedia seus documentos, como disse no disco seguinte, Alucinação, 1976, na música Fotografia 3x4, revela a estupefação e admiração do jovem que, com seu talento em peso, desceu do norte pra cidade grande.
“Meu amor, meu amor, meu amor / vamos andar / e passear”, replica o verbo de movimento transitivo direto que lembra mãos dadas, com ele, que se dizia “apenas o cantor”, e sua história, que “é talvez igual a sua”, “por entre carros”, saindo "pela rua da Consolação" onde chegaria a um pedaço de verde na metrópole, pudesse se deitar na grama, olhar para o céu sem prédios “dormir no parque em plena quarta-feira / e sonhar com o domingo em nosso coração.”.
Belchior, o cearense de Sobral, nessa música dialoga em cumplicidade de sentimentos com outro nordestino, o baiano de Irará, Tom Zé, que um ano antes lançou Todos os olhos, pela Continental, e disse que entre a vaidade da rua Augusta e a maldade da rua Angélica, graças a Deus encontrou a rua da Consolação “que veio olhar por mim / e me deu a mão.”.
Na letra de Augusta, Angélica e Consolação, segunda do lado B, Tom Zé sintetiza a cinesia de vários domingos nas expressões de alinhamento de três ruas importantes da capital paulista, e paralela e poeticamente configura nomes de mulheres fortes, de amores e dores, convergindo naquela que o acolhe, a que etimologicamente consola. A rua Consolação é conhecida pelo fluxo de automóveis – os mesmos carros da canção Passeio - e na ponta final passa pelo Largo dos Aflitos, chegando à Estação da Luz. Belchior com seu vasto bigode no sol do parque, no barulho metálico de uma quarta-feira, sonhando com a luminosidade do fim de semana <> Tom Zé com seus cabelos tropicalistas “na estação da luz, / porque estava tudo escuro / dentro do meu coração.”.
Não dá para largar a mão de Belchior nesse passeio, e sentir a perplexidade paroxítona da “eletricidade / desta cidade” que lhe "dá vontade“ de "gritar que apaixonado eu sou”. Espanto e paixão tão bem colocados na simetria que pronunciam os versos seguintes: “neste cimento” que pulsa o abstrato do “meu pensamento”, que demonstra o contrafluxo do “meu sentimento”, que “só tem um momento”, o agora para “fugir no disco voador”.
Não, se não ficasse naquela cidade, não voltaria pro sertão. O novo sempre vem. Como veio também, naquele mesmo sintomático ano de 1973, na figura de outro baiano, que diante "as cercas embandeiradas que separam quintais" na cidade grande, fugiria “no cume calmo do meu olho que vê / assenta a sombra sonora dum disco voador”. Raul Seixas e Belchior igualmente se encontrando e com uma “porção de coisas grandes pra conquistar”, desafiando todas as dimensões, criando sociedades alternativas latino-americanas na música brasileira.
30 de abril de 2017, um domingo em nosso coração: Belchior ficou encantado com uma nova invenção e partiu, depois de “há tempo muito tempo longe de casa”, a léguas tiranas das margens do rio Acaraú que corta sua aldeia, nessas ilhas cheias de distância em Santa Cruz do Sul nos pampas gaúchos.
28 de fevereiro de 2021, outro domingo como se fosse dia 30 em nosso coração, porque o mês é curto e a saudade extensa. Porque amanhã será dia 1º, como foi naquele feriado trabalhador de maio, há três anos e nove meses, quando, ao contrário do que prescreveu nos versos de Como nossos pais, voltou pro sertão, não como queríamos, não como o aguardávamos no palco do Anfiteatro Dragão do Mar, em Fortaleza, onde fomos ouvir seu último silêncio.
Assim como passeamos por suas canções, pelas ruas de São Paulo, de Fortaleza, do Rio Grande do Sul, e tantos brasis, caminhamos em despedida naquela segunda-feira em direção a sua nova e última estação.
“O anjo do Senhor / de quem nos fala o Livro Santo / desceu do céu pra uma cerveja, junto dele, no seu canto.”
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Texto do meu livro em preparação ©Crônicas do Olhar, a ser lançado pela
Editora Radiadora
, com adaptações para esta postagem.
foto Mário Luiz Thompson, capa do disco Belchior, 1973.

sábado, 27 de fevereiro de 2021

a luz de Sérvulo


O grande artista plástico cearense Sérvulo Esmeraldo, o poeta da geometria construtiva na escultura, faria hoje 92 anos ao redor do sol. Suas obras continuam pelos salões, pelas ruas, na memória de todos nós que o amamos. Tornamo-nos para sempre no coração de quem nos quer bem.

O fotógrafo
Jarbas Oliveira
esculpiu sua luz à altura do retratado, em 2009. Revelou-se nossa enorme gratidão à Sérvulo.
Simetria que a arte eterniza, entre a beleza e a saudade.

o energúmeno


Os presidentes do período da ditadura militar, ao sair do Executivo, não costumavam dar depoimentos, registrar suas impressões ao longo da vida pública. O general Ernesto Geisel, que governou e amedrontou de 1974 a 1979, justamente o que mais evitava a imprensa e historiadores, concedeu entrevista aos pesquisadores Maria Celina D’Araújo, doutora em ciências políticas, e Celso Castro, doutor em antropologia social, ambos do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, da Fundação Getúlio Vargas.

O encontro foi em 1993, três anos antes do falecimento de Geisel. O Brasil era presidido por Itamar Franco, clima de plebiscito para a escolha e a forma de governo, instituição da Unidade Real de Valor (URV), que deu início ao programa do Plano Real.
Geisel conversou horas e horas com os pesquisadores. Falou sobre a infância no Rio Grande do Sul, a formação profissional e intelectual, as funções na administração pública e experiência no Exército, sua participação nas ações na Revolução de 1930 e combate a Revolução Constitucionalista de 1932, e, obviamente, sua atuação no regime militar antes, durante e depois da presidência da República.
O resultado da longa entrevista resultou no livro Ernesto Geisel, publicado pela Editora Fundação Getúlio Vargas, 1997.
Na página 113, o general fala sobre a presença de militares no Congresso Nacional. Esse abjeto, esse inepto, esse gambá presigárcula com o tubo final dos intestinos no cérebro, essa alma sebosa que atualmente ocupa a cadeira de presidente no Palácio do Planalto com seu desgoverno genocida, à época deputado federal pelo Rio de Janeiro, é citado e devidamente classificado.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

cardápio dos prazeres


No começo de 1963, dona Euzébia Silva do Nascimento e seu marido Angenor de Oliveira moravam num sobrado na Rua dos Andradas, no centro do Rio de Janeiro. Ele era zelador do prédio e ela vendia marmitas para os motoristas e os cobradores de ônibus da Praça Mauá.

Ali funcionava a Associação das Escolas de Samba, e o casal, sambistas da Mangueira, organizava rodas de samba nos fins de semana. Cozinheira de mão cheia de temperos, dona Euzébia fazia uns pratinhos saborosos para os frequentadores animados. O samba e a comida foram se espalhando em comentários, o público aumentou, e um pequeno empresário amigo do casal propôs uma sociedade: criar um restaurante. E deu certo.
Como o prédio da Associação seria demolido em breve, o casal, agora sambistas-empresários, mudou-se para um endereço próximo, na Rua da Carioca. Em setembro daquele ano foi inaugurado o restaurante com a razão social Refeição Caseira Ltda, mais conhecido como Zicartola, acrônico dos apelidos Zica (dona Euzébia) e Cartola (seu Angenor).
O livro Zicartola: Política e Samba na Casa de Cartola e Dona Zica, do historiador Maurício Barros de Castro, lançado em 2004 pela Editora Relume Dumara, é uma preciosidade em informações sobre esse local importante na música brasileira. O autor faz a biografia de uma época e espaço gastronômico, onde passaram os maiores compositores de samba e nomes de resistência cultural ao golpe de 1964.
As pessoas se apertavam no pequeno salão para se deliciar com os pratos de Dona Zica e ouvir os sambas de Carlos Cachaça, Elton Medeiros, Nelson Cavaquinho, Nelson Sargento, Ismael Silva, Zé Keti, e, entre tantos, o próprio Cartola, e a turma da Bossa Nova, como Carlos Lira e Nara Leão.
O poeta Ferreira Gullar, o compositor e produtor musical Hermínio Bello de Carvalho, o dramaturgo e ator Oduvaldo Viana Júnior, a atriz Leila Diniz, o cineasta
Luiz Carlos Lacerda
, o carnavalesco e cenógrafo Fernando Pamplona, eram alguns que marcavam presença no restaurante.
O jornalista e pesquisador Sérgio Cabral deu o nome artístico a um rapaz franzino, bancário, que mostrava umas composições que atraiam a atenção de todos: Paulo César Batista de Farias não era nome de sambista, disse Cabral, seria a partir daquele dia Paulinho da Viola. E foi lá que ele recebeu o primeiro cachê como cantor, das mãos do mestre Cartola.
O sócio do restaurante não conseguiu continuar e deixou aos cuidados de Dona Zica e Cartola, que sem jeito para administração, passaram o ponto para Jackson do Pandeiro, que também não deu conta de segurar o comércio com forró e comida nordestina. Em maio de 1965 fechou de vez.
No restaurante Zicartola tudo era talento e prazer: a comida, os fregueses, a música... até o ilustrador do cardápio foi o compositor e pintor Heitor dos Prazeres.
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Texto do meu livro em preparação ©"Crônicas do Olhar", a ser lançado pela
Editora Radiadora
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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

pálperas de neblina


“Ah, Giulietta Masina / Ah, vídeo de uma outra luz / Pálpebras de neblina, pele d'alma / Giulietta Masina”

- versos da canção Giulietta Masina, de Caetano Veloso, gravada no disco, Omaggio a Federico e Giulietta, 1999.
Giulietta Masina interpreta uma prostituta, Maria 'Cabiria' Ceccarelli, nas ruas de Roma, nos anos 50, no clássico Noites de Cabíria (Le notti di Cabiria), dirigido pelo marido Federico Fellini. O filme é de 1957, e impossível não se comover com essa mulher ingênua, que sonha com o amor perfeito, que acredita na bondade de todos, o que a faz sofrer com as constantes decepções.
Caetano Veloso, ao compor a canção, traduziu bem a beleza de interpretação da atriz, que se entrega e se integra à pureza de um dos seus personagens mais marcantes. “Aquela cara é o coração de Jesus”, diz um verso sobre a icônica cena em que Fellini flagra a esperança na lágrima negra no rosto de Cabíria, ali retratando a Itália que se livrava do fascismo e via no alvorecer da próxima década, os revolucionários anos 60, o tempo para se reerguer das ruínas. O seu próximo filme é sintomaticamente A doce vida (La dolce vita), transição do estilo neorrealismo para o simbolismo, onde mostra uma Roma moderna, sofisticada, mas sem poupar crítica aos sinais da influência norte-americana, aos conceitos religiosos e à aristocracia decadente.
Fellini e Giulietta Masina comemoraram cinco décadas de casamento em 30 de outubro de 1993. No dia seguinte aos festejos, o cineasta dormiu para sempre. Cinco meses depois Giulietta o segue, torna-se “vídeo de uma outra luz”. Tinha a mesma idade do marido, 73 anos, e a mesma saudade que ele levou.
Em 2019, em homenagem à carismática atriz italiana, foi criado o Cabíria Festival – Mulheres e Audiovisual, São Paulo, totalmente dedicado à produção realizada por mulheres e pessoas de identidades de gênero, para promover maior representatividade e diversidade nas telas e atrás das câmeras. A segunda edição, no final do ano passado, por conta das restrições da pandemia, o formato foi online.
Hoje um século de nascimento da atriz de luz puríssima.

domingo, 21 de fevereiro de 2021

concentração de tempos

foto Coleção José Medeiros/Acervo Instituto Moreira Salles

A mais de 500 metros acima do nível do mar, mais alto que o Pão de Açúcar, mais baixo que o Corcovado, o Morro Dois Irmãos sobe o bairro do Vidigal, na cidade do Rio de Janeiro, e lá de cima o olhar se estende pelo Leblon, Ipanema, Copacabana, Gávea, São Conrado, e vê-se o Cristo Redentor e a comunidade da Rocinha.

Do alto, as retinas que miram a beleza, filtram o murmúrio da cidade, as ruas em convulsão, os homens e seus muitos irmãos, seus tantos desafetos, entre trânsito e transe, entre mares e margens, entre rios e janeiros.
Debaixo, “aprendi a respeitar tua prumada / e desconfiar do teu silêncio”, como cantou Chico Buarque em Morro Dois Irmãos”, 1989. Orquídeas, bromélias, antúrio, velózia, esquilos, gambás, gavião, pica-pau, a natureza que as retinas sabem e ouvem "a pulsação atravessada / do que foi e o que será noutra existência / é assim como se a rocha dilatada / fosse uma concentração de tempos”, ainda Chico em louvação.
A montanha aponta o mar sem medo dos homens. “As luzes brilham no Vidigal / e não precisam de você. / Os Dois Irmãos também não precisam", como salientou o poeta Antônio Cícero nos versos de Virgem, que Marina Lima gravou no disco de 1987. Os dois irmãos em referência e reverência aos Dois Irmãos.
Em 1952, o fotógrafo José Medeiros, um poeta da luz, do Arpoador fez a belíssima imagem do Morro, com a Pedra da Gávea, as praias de Ipanema e Leblon, e a moldura de dois carros para os irmãos ao fundo.
Nas canções e na fotografia, e na mesma linha, a cabeça, o olho e o coração, como dizia Cartier-Bresson.
Foto: Coleção José Medeiros/Acervo Instituto Moreira Salles

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

o santo guerreiro e o dragão da maldade


Na foto, José Mojica Marins, o nosso arquétipo tupiniquim Zé do Caixão, de frente para o Drácula de Christopher Lee, personagem vulpino das trevas transilvânicas.

A imagem é curiosamente simbólica. O cinema do chamado Terceiro Mundo, com sua tática de produção de guerrilha, de dificuldades de realização, a feitura trash que cria uma narrativa inventiva, diante de um cinema de Primeiro Mundo, com mais condições de provocar medo e um mercado de distribuição assustador para nosso cinema.
Mas Zé do Caixão colocava suas unhas grandes sobre eles. O encontro dos atores aconteceu durante um domingo “sinistro” na 3ª Convenção do Cinema Fantástico, em Paris, 1974.
Adoentado desde 2014, quando sofreu um infarto, problemas de saúde crescentes, um rim comprometido, infecções no cateter, e um pouco de degeneração mental pela senilidade, Mojica Marins faleceu na tarde do dia 19 de fevereiro do ano passado. Ele estava internado no hospital Sancta Maggiore, em São Paulo, desde o final de janeiro.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

o homem que amou o Brasil


“Os escritores, segundo Darcy Ribeiro, dividiam-se em dois grupos: os áulicos e os iracundos. E ele com alegria se alistava no segundo grupo. Os áulicos eram aqueles que viviam à sombra do poder, produzindo ideias verdadeiras, mas irrelevantes, ideias ou planos que não deixavam nenhuma marca no mundo ou se limitavam a ilustrar com exemplos do Hemisfério Sul as teorias importadas do Hemisfério Norte. E os iracundos eram os intelectuais indignados, desafiadores, como o poeta português Gregório de Matos, em cuja obra, segundo Darcy, o Brasil foi brasileiro pela primeira vez.”

- Juca Ferreira, quando ministro da Cultura do governo Lula, na apresentação do livro Meus índios, minha gente, coletânea de alguns textos do grande antropólogo e educador brasileiro.
Organizado pelo jornalista Eric Nepomuceno, os artigos relatam suas impressões sobre o tempo em que conviveu com diversas etnias indígenas no Brasil.
(Uma observação sobre o texto acima: Gregório de Matos, nascido em 1636 em Salvador, Capitania da Baía do Brasil Colonial, era de nacionalidade portuguesa como todo cidadão nascido antes da independência no século XIX).
Sobre esse bravo e indignado iracundo, vale lembrar uma resumidíssima linha do tempo - porque Darcy é imenso - de sua trajetória logo após o golpe militar de 1964, que destituiu o governo João Goulart, quando foi ministro da Educação e ministro-chefe da Casa Civil.
Com seus direitos políticos cassados e obrigado a se exilar em 1968, Darcy estava em Portugal em 1974 quando foi diagnosticado com câncer no pulmão. O governo Geisel autorizou seu retorno ao Brasil para fazer tratamento. “Eles imaginavam que eu voltaria para morrer'', dizia Darcy sobre o desejo dos militares. O antropólogo enfrentou a doença, foi eleito vice-governador do Rio de Janeiro na chapa de Leonel Brizola, em 1982, iniciou seu mandato como senador pelo PDT em 1991, e no ano seguinte imortal na Academia Brasileira de Letras.
Sua vasta bibliografia de mais 30 títulos inclui obras sobre etnologia, educação, antropologia, romances e ensaios, muitas delas traduzidas em diversas línguas, do inglês ao hebraico.
O lento processo canceroso que se agravou nos anos 90 comoveu o país. Darcy sempre altivo, resistente, polêmico que encantava com sua oratória, um ardoroso defensor de suas ideias. Cruzei com ele uma vez pelos corredores do Congresso bradando que o presidente Fernando Henrique tomasse uma decisão digna e não privatizasse a Vale do Rio Doce. Outro momento marcante que vi foi quando, já debilitado, apareceu em uma cadeira de rodas no plenário do Senado, no dia 4 de fevereiro de 1997, para a eleição do presidente da Casa. Com a urna vindo até ele, declarou seu voto ao medebista Iris Rezende, que perdeu para Antonio Carlos Magalhães, então filiado ao DEM.
Uma semana depois da votação, no dia 13, Darcy foi internado no hospital Sarah Kubitschek, em Brasília, apresentando fortes sinais de anemia, dores no corpo e problemas respiratórios. Dois dias depois de fazer exames, pediu que viesse ao seu quarto a diretora da recém-criada Fundação Darcy Ribeiro, escritora Vera Brandt, e a orientou sobre a manutenção do Projeto Caboclo, estudo que desenvolve experiências em biotecnologia, unindo pesca, extrativismo, caça e agricultura junto aos povos da floresta amazônica. Lembrou a ela que também desse uma olhada nos direitos autorais de seus livros. Lançara dois anos antes uma obra que se tornou imprescindível para a compreensão das matrizes culturais e dos mecanismos de formação étnica do Brasil, O povo brasileiro. O sertanejo, o criolo, o caboclo, o caipira, o sulino, tudo ali numa precisa cartografia das classes sociais, livro que, como diz na apresentação, durou 30 anos para concluir.
Nesse mesmo dia, após o encontro com Brandt, chamou a médica que lhe assistia e disse: "Doutora, estou com uma vontade de dar uma aula, a senhora me traz uma criança pra eu dar a aula?“. Horas depois, ali no leito, Darcy deu aula a uma criança de 9 anos. Falou sobre o Brasil, sobre a importância de respeitar todas as culturas. Falou sobre escolas e sambódromos. Era o testamento que ele queria deixar.
Era madrugada do dia 17 de fevereiro quando o antropólogo disse à enfermeira que queria fazer a barba, vestir-se e participar do seminário do Projeto Caboclo que acontecia num hotel da Capital. Diante a lucidez de seu amor pelo Brasil e o delírio de atravessar as limitações de suas forças físicas, a equipe médica o convenceu o contrário. Não tinha condições para tanto. O sol batia de leve na janela do seu quarto, amanhecendo a segunda-feira e a semana ainda de ressaca de carnaval, quando Darcy Ribeiro foi levado às pressas a um leito da UTI. Faleceu poucas horas depois, aos 74 anos. Falência múltipla de órgãos provocada por uma neoplasia maligna da próstata, que gerou metástases ósseas, certificou o boletim do hospital.
Nunca o Brasil foi tão amado por um homem só. Nunca o Brasil foi tão brasileiro na existência de Darcy Ribeiro. Hoje 24 anos que ele não morreu.
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Texto para o meu livro em preparação ©Crônicas do Olhar, a ser lançado pela
Editora Radiadora
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2022 será o ano do seu centenário. O Brasil que segue até lá não é o Brasil que Darcy imaginou. Ele dizia que tinha fracassado em tudo na vida, em alfabetizar as crianças, salvar os índios, fazer uma universidade séria, fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente, mas tinha os fracassos como vitória, pois detestaria estar no lugar de quem venceu. Diria o mesmo agora, no ano III da Era Tosca em que vivemos, diante o desgoverno da mais abjeta coisa que surgiu na história da política brasileira: um ser nefasto, uma alma bissexta, uma cara de cão - parafraseando a canção de Gil.
Na imagem ilustrativa para esta postagem, o antropólogo com rosto pintado por índios Kadiwéu, em Matogrosso do Sul, 1947, fotografado por Berta Gleizer Ribeiro, também antropóloga e etnóloga, esposa de Darcy, falecida aos 73 anos, nove meses depois dele.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

boletim de um tempo


Nasci em crateús, sertão dos inhamus, ceará, numa manhã de fevereiro, dia 15, uma terça-feira, uma semana antes do último dia carnaval. A lua estava minguante. Enquanto eu crescia rumo à lua nova, me esquivava da folia que chegava no peito de minha mãe que me guardava.

Aprendi as letras e os números com madrinha francisca e nunca apanhei de sua palmatória pendurada na parede.
Cresci entre fiapos de pano das máquinas de costura de minha avó e tias-avós, que fizeram minhas primeiras roupas para usar nos retratos e na praça da matriz.
Fui para Fortaleza aos dez anos de idade. Morei numa casinha de três vãos no final do bairro Nossa Senhora das Graças e começo do Pirambu. Meu pai era operário da Fábrica São Judas Tadeu e defendia as reformas base de Jango. Estudei no Monsenhor Hélio Campos, no Sales Campos, no Liceu, no João Pontes, e Letras na Universidade Estadual do Ceará.
Escrevi nos muros, nos cadernos Avante, em papel almaço, na palma da mão. Escrevi cartas, me escondi nos diários, me expus nos cadernos literários dos jornais, em páginas de revistas. Publiquei livros de poesia, ganhei prêmios, perdi outros. Sou professor de Literatura e aprendo com quem me escuta.
Aprendi cinema nos sets. Escrevi roteiros e continuo. Dirigi filmes e sou reincidente, ganhei prêmios, perdi tantos. Sou professor de cinema e aprendo com quem me assiste. Não seria cineasta se não fosse antes poeta.
É só. É tudo. Tenho a idade que aparento.
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Dados biográficos no meu livro-poema Trem da memória, dedicado à casa onde nasci, em que narro minha infância do interior (onde rabisco os nomes próprios em letras minúsculas, porque sou menino) aos primeiros anos na capital (onde escrevo com maiúsculas porque acho que sou adulto).
Com lançamento presencial adiado, pela
Editora Radiadora
, desde março do ano pandêmico de 2020, a previsão será não sei quando for possível a aglomeração dos afetos.

domingo, 14 de fevereiro de 2021

o último carnaval


No dia 17 de fevereiro de 1973 Pixinguinha veste o seu melhor e mais engomado terno de linho branco, e de sua casa, em Ramos, zona norte do Rio de Janeiro, segue para o batizado do filho de um grande amigo, na Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. Poucas horas antes de sair, recebeu as visitas do compositor e produtor musical Hermínio Belo de Carvalho e do fotógrafo Walter Firmo.
Era pleno sábado de carnaval. Estivera adoentado naqueles últimos dias, mas o mestre atravessa a cidade entre alguns foliões, sereno e contente com o seu compromisso.
Já se aproximando o final da cerimônia, logo após a criança receber a água benta, Pixinguinha afrouxa a gravata, passa o lenço na testa... começa a passar mal. Em segundos cai, fulminado por um infarto, aos 75 anos.
A notícia se espalha rápido pelas ruas do bairro. Naquele momento, cai um temporal na capital carioca. Ao saberem do ocorrido, os componentes da Banda Ipanema, que estavam próximos da igreja, sob o comando do lendário Albino Pinheiro, continuam o desfile e tocam "Carinhoso" entre lágrimas e chuva. Era a estreia da Banda. E dessa forma foi abençoada pelo santo Pixinga num improvisado enredo de reverência. O coração de todos batendo triste e seguindo o mestre pelas ruas com as cores dos confetes molhados se desmanchando.
Na manhã seguinte o corpo do músico segue para o Cemitério de Inhaúma, onde estava sua esposa, falecida há um ano. Um cortejo carinhoso de choros naquela transversal manhã de um domingo sem carnaval.
Walter Firmo conta na biografia “Pixinguinha: Vida e Obra”, de Sergio Cabral, 1978, que sabia que o amigo não estava muito bem de saúde, com visíveis traços de decadência física. Autor da clássica foto de Pixinguinha, de 1967, sentado numa cadeira de balanço, debaixo de uma mangueira em sua casa, com o saxofone no colo, preferiu preservar a imagem do músico e não levou sua máquina naquela que seria sua última visita. Mas se arrepende ao lembrar o olhar de despedida de Pixinguinha na moldura da janela. A foto que não fez ficou gravada no “tato das retinas”, como diz o poeta Domingos Pereira Netto.
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Texto para o meu livro em preparação ©Crônicas do Olhar a ser lançado pela
Editora Radiadora
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Ilustração para esta postagem: Elifas Andreato, capa do disco Pixinguinha - Dez anos sem ele, 1983.

corações afinados


"Naquele dia, não sei porque, fui dormir e não esperei ele chegar. Soube que ele chegou, tirou o paletó, sentou ao piano e tocou ‘Noturno’. Quando terminou, virou o pescoço para trás, como se fosse descansar, e não acordou mais".

Assim relata o pianista e professor Renato Mendonça sobre a morte do seu pai, o compositor Newton Mendonça, aos 33 anos, em 1960. O filho não dormia enquanto ele não chegasse trazendo uma barra de chocolate. Mas naquela noite o sono do menino não deixou ver o sono definitivo do pai, abatido por uma nota só de um enfarto no silêncio noturno de sua casa.
Newton Mendonça, que hoje faria 94 anos, foi um dos principais criadores da Bossa Nova, quando João Gilberto gravou Desafinado, parceria com Tom Jobim, no seu primeiro disco, Chega de saudade, 1959.
Assim como a faixa-título, a composição tornou-se icônica naquele jeito novo de cantar, quase sussurrando no ouvido o que dizia o peito de um desafinado.
Mendonça deixou poucas canções, mas todas com sucesso e reconhecimento por quem gravou. Revelou-se na história da música brasileira a nossa enorme gratidão.
Abaixo, na granulação de uma foto de álbum de família, os corações afinados dos Mendonças: o grão do pai, o pão do filho.

sábado, 13 de fevereiro de 2021

je ne regrette rien


foto William Aguiar, 2013

O grande ator Procópio Ferreira dizia que “a minha velhice é definitiva, a sua juventude, provisória. Sorte daqueles que ficam velhos." Chegou aos 80 anos quando partiu em 1979.

A sua filha Bibi Ferreira, diva do teatro brasileiro, estendeu por mais algum tempo a sorte de envelhecer: partiu para outros palcos no começo da tarde de 13 de fevereiro de 2019, aos 96 anos.
A clássica canção Non, Je Ne Regrette Rien, de Michel Vaucaire e Charles Dumont, eternizada na voz d’alma de Édith Piaf, ficou igualmente como uma marca na interpretação de Bibi. Piaf gravou em 1960 e dedicou à Legião Estrangeira, que à época lutava na Guerra de Independência da Argélia.
Nos anos 2000 Bibi começou a realizar musicais focados no repertório da cantora francesa. Os teatros lotados revelaram nossa enorme gratidão às canções que ela cantou para nós.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

dias chuvosos de lágrimas

 

foto Acervo FotoBsb

Nos últimos dias chuvas repentinas em Brasília. O tempo fecha. Trovões, relâmpagos. As entrequadras se alagam. Olhamos da janela.

Nos últimos dias partiram repentinamente o músico Toninho Maya, o cineasta Bernardo Bernardes, e hoje Luis Humberto, aos 86 anos, referência do fotojornalismo brasileiro.
Nosso peito se fecha. Soluços, perplexidade. As entrequadras em lágrimas. Oramos da janela.
A vida toda é saudade.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

o cinema infinito de Eisenstein


Realizado em 1924, A greve (Stachka), de Serguei Eisenstein, é o mais importante filme sobre a força da classe trabalhadora como organização. Narra uma rebelião dos operários de uma fábrica na Rússia pré-revolucionária do início do século passado. Com enredo ficcional e uma estrutura surpreendentemente documental, ainda na era do cinema mudo, o filme expressa o poder de massa, de coletivismo sobre o individualismo institucionalizado.

É um dos mais significativos filmes sobre o que se desenvolveu como linguagem cinematográfica. Eisenstein criou em A greve o recurso narrativo “cross-curting”, técnica de corte entre ações paralelas, estabelecendo tramas em diferentes locais ou situações, mas que têm significados conotativos na simultaneidade do enredo. A cena de repressão contra a greve nas ruas com outra de uma manada sendo abatida no matadouro, provocam no espectador o impacto, o incômodo, a reflexão.
Um ano após A greve, Eisenstein realiza outro filme fundamental para a história da cinematografia mundial, O Encouraçado Potemkin (Bronenosets Potyomkin), versão dramatizada da rebelião dos tripulantes do navio de guerra da Marinha Imperial Russa de Frota do Mar Negro, contra seus oficiais superiores, ocorrida em 1905. Nesse clássico estão ampliadas, testadas, aprovadas e cristalizadas as mais revolucionárias teorias de montagem. O experimento de Eisenstein foi decisivo para consolidar o conceito de edição, o efeito potencial, emocional e reflexivo da imagem no público.
Ivan, o Terrível (Ivan Grozniy), seu último filme, concebido em três partes, numa estrutura operística como fizera em Potemkim, com cinco atos, começou a ser rodado em plena Segunda Guerra, 1944. Encomendado por Josef Stalin, que admirava e se identificava como um sucessor do Ivan IV, o Grão-Príncipe de Moscou do Século 16, o filme teve a segunda parte banida, assim como foi interrompida a terceira parte no meio das filmagens. O secretário-geral soviético não gostou como foi retratado.
Eisenstein faleceu em 11 de fevereiro de 1948, aos 50 anos, de ataque cardíaco. Ivan, o Terrível lançado dez anos depois, incompleto. Os negativos do terceiro ato foram destruídos.
Cito aqui três trabalhos do cineasta. Mas sua filmografia de treze títulos, entre eles, Outubro, A linha geral, Que viva México, Alexandre Nevski, é vasta pela relevância de cada obra para a compreensão do cinema como expressão artística.
Eisenstein e cinema são sinônimos. A palavra de um com o sentido do outro. Ambos imensuráveis, contínuos, imortais. Como disse Vinicius de Moraes em seu poema dedicado ao cineasta, Tríptico na morte de Sergei Mikhailovitch Eisenstein, de 1948:
O cinema é a presciente antevisão
Na sucessão de imagens. O cinema
É o que não se vê, é o que não é
Mas resulta: a indizível dimensão.
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Texto para o meu livro em preparação ©Crônicas do Olhar, a ser lançado pela
Editora Radiadora
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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

o último voo


"Cerveja que tomo hoje é apenas em memória / dos tempos da Panair / a primeira Coca-Cola foi me lembro bem agora / nas asas da Panair / a maior das maravilhas foi voando sobre o mundo / nas asas da Panair..."

Trecho de Conversando no Bar - (Saudade dos Aviões da Panair), música de Milton Nascimento, letra de Fernando Brant, de 1974, eternizada na voz de Elis Regina e do próprio Bituca.
A Panair, abreviatura de PAN American AIRrways, foi uma das companhias aéreas pioneiras no Brasil, subsidiária de uma empresa norte-americana, a NYRBA, extinta pelo governo militar, há 56 anos, num 10 de fevereiro violento, cheio de arbitrariedades. Foram 35 anos de voos. A história da Panair é longa e complicada.
Sabe-se que a VARIG era a grande interessada em tomar conta dos céus do país. Ruben Berta, proprietário da empresa gaúcha, era apoiador do regime e amigo pessoal de diversos militares de alta patente.
Creditaram o fim da Panair a João Goulart, quando, na verdade, ele tentou para que as ações da empresa ficassem em mãos brasileiras, uma vez que o setor de aviação era dominado por sócios estrangeiros. O governo militar aproveitou a "deixa" e favoreceu a VARIG por motivos óbvios. Panair do Brasil, um oportuno documentário dirigido por Marco Altberg em 2009, detalha o assunto.
A canção de Milton tem um ar de melancolia, num voo de languidez e saudade.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

belo e eternamente jovem


Em 1949 Nicholas Ray dirigiu o ótimo drama noir O crime não compensa (Knock on any door), estrelado adequadamente pelo cara de mármore Humphrey Bogart. Mas é o personagem de John Derek, um jovem desajustado, o mais marcante no filme, e a certa altura de uma cena diz “Live fast, die young, leave a good-looking corpse” / “Viva rápido, morra jovem e deixe um cadáver bonito”.

Seis anos depois, Ray volta ao tema no clássico Juventude transviada (Rebel without a cause), com James Dean no papel do problemático Jim Stark. Provavelmente, o diretor deve ter lembrado a frase para o ator, que a tomou para si, sempre repetindo em entrevistas, a ponto de ser creditada de sua autoria.
James Dean não disse a frase, mas incorporou literalmente o sentido fora das telas, pois vivia intensamente na velocidade dos dias. Tinha paixão por automobilismo, que ele chamava de "perspectivas libertadoras". Com a grana que recebeu por seu trabalho em Vidas amargas, de Elia Kazan, comprou alguns carros e passou a correr em eventos profissionais.
Seu coração selvagem tinha pressa de viver. Morreu jovem numa curva do caminho quando seu Porsche 440 a 135 quilômetros por hora completou o seu destino. Eram 17h45 quando o sol amarelava no poente das colinas, na Rota 466, no caminho de Los Angeles a Salinas.
O aquariano “good-looking corpse” de 24 anos hoje faria 90.
O ator fotografado em sua casa por Sanford Roth, 1955.

o sempre jovem Zé Tarcísio


Em julho de 2018 o Museu de Arte Contemporâneo, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em Fortaleza, abriu a exposição Zé: Acervo de Experiências Vitais, em homenagem ao cearense Z
é Tarcísio.

Com curadoria de Bitu Cassundé e Cecília Andrade, a exposição foi uma mostra panorâmica da vida e obra do artista plástico, pois “tudo que vivi se incorporou, automaticamente, ao meu acervo de experiências vitais, estando de uma ou outra forma, expresso em meus trabalhos”, como afirmou o sempre alegre Zé, brilhante com seus olhos de amável bruxo.
Com obras de seu acervo, coleções particulares e de órgãos institucionais como do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, a exposição reuniu mais de 100 trabalhos entre pinturas, esculturas, instalações, fotos e vídeos, ocupando três ambientes do Museu.
Os trabalhos foram agrupados pelos espaços numa concepção que se integra aos signos de criação do autor. As peças produzidas nas décadas de 60 e 70, por exemplo, refletem questões ambientais, do corpo, comportamento, e se estendem às questões políticas, quando Zé Tarcísio esteve ligado a movimentos de resistência e teve seus trabalhos apreendidos pelos censores da ditadura.
Foi uma honra ser convidado para escrever o roteiro do vídeo Zé Tarcísio, apresentado na noite de abertura da exposição, e que ficou em exibição no período em que esteve aberta.
Juntamente com uma equipe afinada nos meus projetos de cinema,
Rui Ferreira
(direção e edição),
Alex Meira
(direção de fotografia),
Lenio Oliveira
(som), e as assistências fundamentais dos fotógrafos Valdo SIlva e
Nildo Silva
, o vídeo narra o percurso de construção do projeto e da composição curatorial, permitindo a todos uma participação afetiva na elaboração da exposição.
Experiências vitais para todos nós, proporcionadas pela essência da arte de Zé Tarcísio, que hoje completa 80 anos de idade, saudável, sorridente, sempre jovem!