Foto Sesc Arsenal
“A noite com seus sortilégios”, como dizia Manuel Bandeira, levou o cineasta Maurice Capovilla há dois anos, no anoitecer de um sábado, 29 de maio. Capô, como todos carinhosamente o chamávamos, tinha 85 anos e não resistiu às complicações de uma doença pulmonar.
Paulista de Valinhos, Capovilla tem seu nome ligado a diversos filmes significativos na história do cinema brasileiro, não somente como diretor, também como roteirista, produtor e ator.
Destaco o sempre bom de rever O profeta da fome, de 1970. Na configuração de um circo pobre, Capô mostra, de forma inteligente e corajosa, a simbologia do país naquela virada de década sob recrudescimento da ditadura com o AI-5: o povo representado na figura de um faquir que é crucificado como parte do espetáculo, e ao ser preso descobre que seu sucesso é passar fome de verdade. E no contraponto, sob o mesmo ambiente da lona rasgada e empoeirada, o domador malvado, estigma do poder e controle. Curiosamente, interpretados por José Mojica Marins e Maurice do Vale, icônicos atores que viveram em filmes daquela década do golpe militar os personagens do mito do horror tupiniquim Zé do Caixão e o caçador de cangaceiros Antonio das Mortes, contratado por latifundiários.
No cinema de Maurice Capovilla o Brasil é o grande personagem.
No final dos anos 90 morou em Fortaleza, e junto com Orlando Senna, trabalhou no projeto original do Instituto Dragão do Mar, núcleo cinematográfico de formação criado pelo governo do estado. Convivi com ele nessa época. Na imagem daquele homem sempre atencioso, seguro e convicto de seus conhecimentos e ensinamentos como cidadão e artista, o personagem de um Brasil do tempo da delicadeza.
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