terça-feira, 21 de outubro de 2025

pé na estrada

Jack Kerouac escreveu On the road (1957) em ritmo ininterrupto de três semanas, numa pequena máquina com folhas de papel manteiga emendadas para não perder tempo em trocá-las, movido a benzedrina, xícaras de café e ouvindo jazz.
A entrega de emoção é tanta, num contrafluxo de transgressão e lirismo, que em cada página podemos ouvir as sonoridades das ruas e ver as planícies das estradas por onde Kerouac passou.
O livro atravessa os Estados Unidos, a partir da lendária Rota 66, e nos atravessa por completo a partir de uma prosa de reflexão pelo lado sombrio do sonho americano. “A sua América inteira... como uma densa colmeia balzaquiana em um grão de joia”, como ele aferiu em Doctor Sax (romance escrito em 1952, publicado em 1959).
On the road é uma obra-prima que influenciou todos os movimentos de vanguarda e o comportamento da juventude da metade do século XX.
Abaixo, a mochila que o escritor usou nas viagens e guardava as anotações que serviram de base para o livro, vista na exposição Sur La Route de Jack Kerouac : L'épopée, de L'écrit à L'écran, no Museu de Letras e Manuscritos de Paris, em 2011.
Hoje, 103 anos de nascimento do mochileiro que não voltou aos 47.

Kerouac


 

segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Rimbaud

Por delicadeza
perdi minha vida.
- Arthur Rimbaud no poema Canção da mais alta torre.
O poeta com sua alma inquieta, um dos mais forte do Simbolismo francês, se foi aos 37. Aliás, não foi, continua nas paredes da memória, reinventando-se em cada verso lembrado, traficando sonhos.
Hoje 171 anos de seu nascimento.
Acima, arte urbana com a imagem do poeta, de Ernest Pignon, Paris, 1978.


 

Rimbaud nas ruas


 

domingo, 19 de outubro de 2025

versos em alto mar

Em 1938, o jovem de 24 anos Marcus Vinicius da Cruz de Melo Moraes, o futuro 'poetinha', ganhou uma bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford.
Em setembro daquele ano, a bordo do navio Highland Patriot, escreveu o belamente dolorido Soneto da separação", motivado pela saudade da namorada Tati, que se tornaria sua primeira esposa.
Os versos partem de uma ausência, e não exatamente de uma ausência que nos parte quando tudo, “de repente, não mais que de repente”, se faz “triste o que se fez amante”. Mas por licença poética, e desespero de causa mesmo, se conjuga nas duas ausências... quando se faz “da vida uma aventura errante”.
Vinicius saltava sem rede de proteção em todos seus relacionamentos. E tornava-se afetivamente dependente e incurável. Toda sua poesia cauciona essa dedicação e arrebatamento. Afinal, aquela a quem se ama “é como o pensamento do filósofo sofrendo”, delineia no poema A brusca poesia da mulher amada, também de 1938.
Quando morava em Itapuã, nos anos 70, o poeta chegava às vezes amuado e deprimido ao atelier do amigo Carlos Bastos. O artista plástico, preocupado, via naquele sessentão um adolescente apaixonado. Dizia para não se entregar tanto, “se distancie um pouco para amar melhor”. Mas Vinicius queria apenas ser ouvido, com carinho, não escutar conselhos. A obstinação sentimental do poeta era parte essencial do amor, como insumos para amar “muito e amiúde” e “morrer de amar mais do que pude”.
E no amor, como no samba, é preciso um bocado de tristeza, senão, não se faz um samba não.
Hoje, 112 anos de seu nascimento. Imortal, posto que é chama.
Ilustração: intervenção sobre logomarca criada pela Agência 6D. 

sexta-feira, 17 de outubro de 2025

quinta-feira, 16 de outubro de 2025

iminências do tempo


“Aqui divido os sertões que carrego com você, que me guiou nas primeiras luzes/sombras, e sempre me levou em seu trem da memória, de tantos cotidianos, com Marias, Gicélia e Valderez”.

Rubens Venâncio assim me dedicou seu livro Iminências, ensaio fotográfico iniciado em 2013 e tornado objeto palpável pelo tato das retinas em 2022. Uma nova leva de exemplares chega à mesa e às mãos próximas dos afetos.
Acompanhei de perto, dos rios e afluentes mais ternos do coração, a história de todo esse processo, as etapas dessa artesania que Rubens tão bem sabe lapidar os traços da memória. Seu trabalho com a fotografia é uma arqueologia no mais fiel significado do grego “anamnese”, quando a matéria prima é a recordação, a lembrança.
Fotografar é só o começo. O congelamento do clique é o início da memória. A fotografia tem esse poder de eternidade: ela atravessa a rua e o tempo.
Quando recebi pelos Correios a caixa com o meu exemplar de Iminências, eu ouvia uma faixa do disco Alambari, da banda ucranina DakhaBrakha. O grupo compõe canções cosmopolitas e vibrantes, tecendo com agudos fios instrumentais e vocais, harmonias, lamentos e esperança, num encontro primoroso do blues e gospel com os temas e ritmos étnicos de sua terra devastada por uma guerra, insana com todas elas.
O anímico da música me acompanhava enquanto abria a caixa e começava a folhear Iminências, trazendo à luz as imagens em polaroid que Rubens lapidou com minimalismo a textura do tempo. Por segundos pensei estar abrindo errado a primeira página, emocionado que estava, ansioso e disfarçadamente atrapalhado, perplexo com a beleza.
“Não tem erro, mas possibilidades”, disse-me Rubens depois. Cada um encontra as fotografias na arca de cada página a sua maneira, com o impulso nato, com a predisposição alquímica das mãos sem aprendizado prévio, sem manual que desfavoreça as curvas no caminho.
A música de DakhaBrakha que corre pelas raízes de seu chão originário, moldou-se como trilha no sertão do Cariri cearense onde Rubens reside, trabalha e sonha.

segunda-feira, 13 de outubro de 2025

a moça que passa


Foto Acervo IMS

O carioca de ascendência francesa Marc Ferrez (1843-1923), foi um completo cronista visual das paisagens e dos costumes da segunda metade do século XIX e do início do século XX.
Não somente o Rio, todas as regiões do Brasil fazem parte da sua valiosa obra iconográfica. Construção de ferrovias e tuneis, movimentos de rebelião no início do governo republicano, escavações de minas. Foi o primeiro a fotografar os índios botocudos no sul da Bahia.
Mas a graça da moça que passa de minissaia na Avenida Rio Branco, em 1910, é de um lirismo transgressor encantador.
Sempre que vejo essa foto, e a tenho em um ponto inevitável na minha estante, remeto-me a uma passagem de O amanuense Belmiro, romance de Cyro dos Anjos ambientado na Belo Horizonte dos anos 30:
“A vida não se conforma com o vazio, e a imagem da moça encheu-me os dias”.
Entre panorama urbano carioca e a provinciana capital mineira, entre a reflexão do amanuense em seu diário e o flagrante do cotidiano de Ferrez, não há necessariamente uma ligação. Apenas minha particular simetria no tempo à procura de encher de dias e significados a semana que começa.

sábado, 11 de outubro de 2025

amar, verbo intransitivo


De todas as ótimas atuações de Diane Keaton no cinema, a interpretação de Sonja em Love and death (no Brasil, A última noite de Boris Grushenko, de Woody Allen, 1975), é particularmente marcante pelos diálogos precisos, afiados, filosóficos. E muito mais no jeito de falar, com sua beleza fulgurante.

Numa das sequências finais, sua prima Natasha expõe a intranquilidade do amor em relacionamentos dela e de pessoas próximas. Depois de ouvir aquele relato que lembra o poema Quadrilha de Drummond, fulano que amava sicrano que não amava beltrano, Sonja tranquilamente diz que “está ficando tarde” e arremata para que a moça compreenda de uma vez por todas o sentido do amor, seus abismos e sortilégios.
O que pode parecer um aforismo verborrágico e engraçado do roteiro de Woody Allen, é muito mais do que um jogo de palavras. O diretor usa diálogos e ambientações que de forma engenhosa parodiam clássicos da literatura russa. Estão lá Dostoiévsky e Tolstoi. E Diane Keaton para dizê-los.
A atriz faleceu hoje aos 79 anos. Tudo sempre fica tarde com a ausência.
Acima, o trecho de amor e dor.

manhã de sábado


 

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

poesia na rua


 

no meio da rua


“Um livro de poesia na gaveta / não adianta nada / lugar de poesia é na calçada”, começava Sérgio Sampaio sua belíssima composição Cada lugar na sua coisa, de 1976.
O poeta cearense Paulo Fraga-Queiroz ouviu o brado inquieto do compositor capixaba e botou nas ruas o bloco do genial projeto Poesia Em Cartaz: pegou 80 autores com respectivos versos curtos e estampou em 80 outdoors pelas ruas de Fortaleza!
E aí me lembrei de um verso de Paulo Leminski que disse por trás de seus óculos e bigode: "Belo seria se os anúncios luminosos não fossem comerciais". Fraga-Queiroz, que também é publicitário, satisfez o desejo do poeta curitibano.
Seu projeto reflete na paisagem urbana a desmercantilização da beleza e da arte. Poesia publicada na pele da cidade, a céu aberto, por suas esquinas e ruas, como registra a sinopse de sua ideia. Uma oportuna reflexão sobre o que é verdadeiramente belo, sobre o impacto da publicidade na sociedade através da poesia e na percepção da realidade na leitura de versos rápidos e tocantes.
Parabéns, Paulo, pelo seu imenso, urgente e necessário trabalho de divulgar poesia nas dimensões 9m x 3m de um outdoor.
Sinto-me honrado por estar na segunda temporada de 20 poetas.
E escolhi um verso que indicasse minha perplexidade e timidez sertaneja.

quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Zélia Sales


 "...as duas se afastaram como se fossem bem ali salvar o mundo"

A poesia e o cinema na prosa de Zélia Sales.
Imensa!

quarta-feira, 8 de outubro de 2025

quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Jane Goodall


 

Poesia em Cartaz


"É com grande alegria que damos início à segunda edição do projeto Poesia em Cartaz.
E para abrir essa jornada, temos mais 20 poetas, letristas, romancistas nesta edição.
Destacamos a poesia de Nirton Venancio.
Poeta reconhecido, Nirton foi premiado em vários concursos nacionais de poesia. Publicou os livros Roteiro dos pássaros (prêmio Filgueira Lima de Poesia), Cumplicidade poética, Poesia provisória e Trem da memória. Além disso, é um dos fundadores do Grupo Siriará de Literatura e editou a revista Comboio de Literatura, ambos em Fortaleza.
Cineasta festejado, seu curta-metragem Um cotidiano perdido no tempo recebeu o prêmio Margarida de Prata da CNBB, além de melhor filme e melhor fotografia na Jornada da Bahia. E O último dia de sol foi premiado nos festivais de Curitiba, Cine Ceará e no Maranhão recebeu o Troféu Jangada da Organização Católica Internacional de Cinema.
Senhoras e senhores, com vocês, Nirton Venancio, um mestre da palavra e da imagem.
Nirton, pra mim, você é um dos grandes responsáveis por incendiar a cena cearense de literatura. Que honra ter você com a gente neste projeto, amigo! Arre-égua, macho! Evoé!
Serão 20 outdoors, 20 poetas, 20 poemas pelas ruas de Fortaleza. Uma miscelânea de vozes para dar conta da poesia nos dias de hoje.
A segunda edição vai acontecer de 06 a 19 de outubro. Ou seja, todos os participantes, a seu tempo, terão o momento de ver seu trabalho na rua e repercutindo nas redes sociais".
- Paulo Fraga-Queiroz, poeta e publicitário

sábado, 27 de setembro de 2025

um anjo em dois


Em Asas do desejo Wim Wenders centraliza a narrativa nas andanças, ou mais propriamente, adejos, de Damiel e Cassiel, como Cosme e Damião redivivos, contemporâneos, costumizados fisicamente de humanos, com seus casacos e imensas asas sobre a garbardine.

Acompanham as desventuras dos mortais do alto, de baixo e do lado, na mesma latitude e longitude da respiração.
Apesar de não sentirem na pele a dimensão das dores e o elevo dos prazeres terrenos, se compadecem e desconhecem em equivalentes proporções.
Caetano em Outros românticos faz um jogo de palavras e sutil aliteração final que remete a Serafim, da legião de anjos mais próximos de Deus na hierarquia celeste.
Anjos sobre Berlim
o mundo desde o fim
e, no entanto, era um sim
e foi e era e é e será sim.

sexta-feira, 26 de setembro de 2025

eu viajei de trem


 "Nirton, finalmente estou conseguindo tempo pra me dedicar a seu livro.

Que bonita essa edição. E que belo e emocionante poema, meu amigo. Todo o conjunto (projeto gráfico, capa e a escrita falam a mesma língua, andam na mesma direção) me leva a viagem que é a sua, por óbvio, mas que também é daquela criança que ainda nos habita e entre nuances e um verso ou outro nos acena. De longe, porém dentro da gente. Enquanto a vida acontece quadro a quadro, da janela, enquanto o trem vai seu caminho. Estou emocionado, amigo! E a viagem ainda não terminou!
Não é à toa que desde a faculdade sou seu fã!"
- Paulo Fraga-Queiroz, poeta e publicitário (Fortaleza-CE)
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Trem da memória, Editora Radiadora, 2022

quarta-feira, 24 de setembro de 2025

o último aceno

Foto: Humberto Araújo
 
E a indesejada das gentes, como disse Manuel Bandeira, chegou hoje dura e ineludível ao ator Guilherme Reis.
Gestor cultural, criador do festival de teatro Cena Contemporânea, que este ano completou três sólidas décadas, Reis foi secretário de Cultura do DF entre 2015 e 2018.
Nossos encontros sempre foram ótimos. Atencioso e amável, muito conversamos sobre cinema. Disse-lhe uma vez que se um dia eu ousasse fazer uma versão do clássico de Cervantes, num viés de releitura no Cerrado, ele seria escalado para o papel de Dom Quixote, pelo tipo físico e certeza que viveria bem o personagem e vestiria adequadamente as indumentárias contra os moinhos de vento. Ele riu, surpreso e agradecido, e emendou que já vivia, como artista brasileiro, na contramão dos ventos difíceis desses moinhos.
Em outubro do ano passado, no velório do cineasta Vladimir Carvalho no hall do cine Brasília, tive um impacto quando ele chegou de cadeira de rodas. Não sabia que estava doente, com problemas pulmonares. Mas não parecia nada debilitado de tão sorridente e altivo. Da mesma forma o reencontrei no mês passado, em sessões do Cena Contemporânea. Na saída de uma das peças na Caixa Cultural, nos cumprimentamos. Ele deu um aperto de mão, olhou-me fixamente com doçura e estendeu um sorriso sem nada dizer.
Ou queria dizer: lutando contra os moinhos de vento para continuar aqui. 

terça-feira, 23 de setembro de 2025

os olhos cheio de cores

Foto: Archivio Cameraphoto Epoche


"Em Cardinales bonitas, eu vou!"

Assim cantava e ia Caetano Veloso como um alento, numa canção que consola, no final da estrofe depois que via nas bancas de revistas o jornal O Sol se repartindo em crimes, espaçonaves, guerrilhas...
Na clássica e sintomática Alegria, alegria, o compositor baiano faz um mosaico de citações daquele agitado 1968, a convulsiva década lá de fora e daqui neste Brasil em caras de presidentes militares...
Assim, entre bombas e Brigitte Bardot, e outras musas da tela do cinema, como Claudia Cardinale, tornavam os olhos cheios de cores e amores vãos... por que não, por que não?
Ela de tão bela era muitas Cardinales. Na canção e no meu coração.
Naquele mesmo ano apaixonei-me por Claudia logo quando ela surge bela e inesperada iluminando a sequência da estação no sensorial de Era uma vez no Oeste, de Sergio Leone.
A atriz tunisiana do cinema italiano partiu hoje aos 87 anos.
Eu menino, puro e besta vindo do interior, mais do que fã, queria casar com ela quando crescer... Grandes beijos de amor.
A ausência agora no meu pretérito imperfeito.

quarta-feira, 17 de setembro de 2025

metomínia de um país



No sertão paraibano em plena ditadura civil-militar dos anos 60, o garoto Teobaldo enfrenta o embate entre o desejo e repressão no momento em que chega um enigmático pesquisador estadunidense ao DNOCS.
Esta é a sinopse do excelente, surpreendente e oportuno Corpo da paz, de Torquato Joel, representante da Paraíba na Mostra Competitiva de Longa-metragem do 58º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Rodado em preto e branco, o filme é narrado numa preciosa composição de planos fechados na maioria e os abertos num grafismo na tela onde nada falta nem sobra. Se o rigor formal da decupagem sufoca na intenção de demonstrar o medo, enquadra com precisão o sentimento e nos coloca organicamente na história, na intimidade do enternecimento e perplexidade dos personagens.
Como um Yasujiro Ozu no agreste paraibano, o diretor conduz em narrativa minimalista: os planos com tripé-baixo, a câmera-tatame à altura dos corações que pulsam curiosidade e estranhamento.
A partir de vivências marcantes e lembranças pessoais, Torquato ambienta esse recorte do período de ditadura em seu chão sertanejo com serenidade, sutileza e lucidez crítica. Através do olhar do garoto, extrai percepções para o entendimento e reflexão de todos. Cada cena é rica em detalhes, cada sequência é extensa em afluentes narrativos.
A vastidão do sertão paraibano é um pedaço daquele Brasil de duas décadas que vivemos de arbitrariedades, de torturas, de corpos sumidos, jogados ao mar, ou “afogados” em açudes, como particularmente é mencionado num diálogo do filme.
O sertão e o garoto Teobaldo como metonímias de um país.
No cinema brasileiro, cada cena é um retrato da nossa história.

terça-feira, 16 de setembro de 2025

o Sundance de Redford






O ator escalado para interpretar Sundance Kid no filme de George Roy Hill (no Brasil Butch Cassidy, 1969) era Steve McQueen, à época já um dos maiores e mais bem pagos astros hollywoodianos. Paul Newman, já vestido no personagem de Cassidy, estava no mesmo nível de estrelato.
A ideia da Century Fox de escolher duas megaestrelas para interpretar os legendários ladrões Butch e Sundance estava dentro dos propósitos de estratégia do estúdio.
O título original, Butch Cassidy and Sundance Kid, passou a ser um problema: Steve McQueen não aceitou o nome do seu personagem vir por último. Houve até a curiosa proposta de fazerem metade das cópias do filme em que listaria Newman primeiro e a outra metade McQueen, que não aceitou e caiu fora.
Decidiram por Robert Redford, um ator até então não muito famoso, embora já com quase dez filmes no currículo, entre eles o ótimo Caçada humana, em que contracena com Marlon Brando e Jane Fonda.
Outro probleminha na fogueira das vaidades: como o título no meio desse impasse tinha mudado para Sundance Kid and Butch Cassidy, Paul Newman achou que passaria a fazer Sundance, mas o diretor o queria no papel de Cassidy mesmo. Então, que voltasse à proposta inicial do projeto, pois Newman exigia ser o primeiro nos créditos.
Robert Redford aceitou ser o segundo e brilhou tanto quanto Newman, que foi andar de bicicleta com Katherine Ross ao som de Raindrops keep fallin' on my head.
Defensor dos indígenas e das paisagens nativas, Robert Redford fez o caminho no cinema a sua maneira, mantendo distância possível dos ditames de Hollywood.
Fundou o Festival de Cinema de Sundance. O último do título se tornou o pioneiro como referência internacional de produções independentes.

o ator e o personagem


 "'Todos os homens do presidente não é apenas sobre a liberdade de informação, é sobre a consequência que esta liberdade tem num país em que a imprensa age sobre o poder, em vez de apenas importuná-lo. (...) E foi sorte também os dois (jornalistas Robert Woodward e Carl Bernstein) parecerem com Robert Redford e Dustin Hoffman. Até Nixon, mais tarde, mais calmo, torceria por eles se visse o filme".

- Luis Fernando Veríssimo em sua crônica O poder e o charme, publicada no livro Banquete com os deuses (Editora Objetiva, 2003).

Redford


 

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Xingu à margem

Longa documentário de Wallace Nogueira e Arlete Juruna (PA/BA)
58° Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
"O rio Xingu não obedece leis, ele vem restaurando e ressuscitando espíritos contra todo o mal a quem o fez", assegura Dona Raimunda.
Sua luta revela a dura realidade de segregação enfrentada pelos ribeirinhos, beiradeiros e indígenas na Volta Grande do Xingu, em Altamira (PA), desde a construção devastadora da Hidelétrica de Belo Monte.
Sua presença na tela e no palco do cine Brasília, ontem à noite, comoveu a plateia. Na figura magra, a história e força de uma mulher combatente.

domingo, 14 de setembro de 2025

hermetismos pascoais


 

o bruxo e a paisagem

Ilustração: Daniel Kondo

Numa das primeiras vezes que Hermeto Pascoal fez show em Brasília, ficou encantado com a cidade. Não exatamente com a arquitetura diferente, mas com o verde por todos os lados.

Quando o carro, vindo do aeroporto em direção ao hotel, entrou no Eixão Sul, uma das largas avenidas de seis faixas que formam o desenho da asa do avião, o músico esverdeou seu olhar albino.
Durante o percurso, entre silêncios e murmúrios melódicos improvisados, elogiava a paisagem na rodagem horizontal da janela.
Em um momento, disse, mais para si do que para quem estava ao seu lado: “Só faltam uns cabritinhos pastando nessa grama”.
Esse episódio sempre me comoveu. No livro de poemas que estou finalizando, A distância e a paisagem – Escritos sobre Brasília, menciono em um trecho:

“e os bodes pastando no verde do Eixão
que o bruxo Hermeto chegando imaginou”.

Ele partiu ontem aos 89 anos.
Ficam na história da música brasileira, em nossa memória afetiva e no molde da saudade, seus hermetismos pascoais que nos salvam e sempre nos salvarão dessas trevas, como bem definiu Caetano. 

sexta-feira, 12 de setembro de 2025

o Agente abre Festival de Brasília

 


Abertura do
58° Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
No cinema brasileiro, cada cena é um retrato da nossa história.