domingo, 2 de novembro de 2025

locações na Palestina

 


Em meados de 1963, Pier Paolo Pasolini viajou a Israel, Jordânia e Palestina. Com ele dois produtores cinematográficos, o diretor de fotografia Tonino Delli Colli, o padre jesuíta Andrea Carraro e o exegeta bíblico Lucio Settimi Caruso.

Marxista, ateu anticlerical, o cineasta preparava a produção de O Evangelho segundo Mateus (1966), uma visão muito própria da pregação e martírio de Jesus Cristo, reinventando a figura mística através dos diálogos canônicos escritos pelo mais realista dos seus quatro discípulos. Pasolini pretendia mostrar, e o fez, não somente um Cristo precatado, mas um líder que questiona e reivindica.

A viagem aos países do Oriente Médio foi para conhecer, analisar e mapear locações para o filme, por isso sua assessoria, a técnica e a religiosa. Pasolini queria filmar nos locais onde Jesus teria passado.

Depois de duas semanas de andança pelo chão sagrado, viajando em aldeias, ouvindo e conhecendo a história do povo árabe com seu plano de partilha transfigurado, o cineasta desiste de levar as câmeras para lá e a produção define as filmagens no sul da Itália.

Naquele começo de década, a Palestina já estava com quase todo seu território ocupado pelo Estado de Israel, fundado logo após a Segunda Guerra Mundial. “Israel é moderna demais. Os palestinos, muito infelizes”, declarou Pasolini em entrevista. Para ele seria impossível acreditar que os ensinamentos de Jesus tivessem alcançado aqueles rostos.

Por outro lado, a viagem resultou em um ótimo documentário de 52 minutos, “Sopralluoghi in Palestina per Il Vangelo Secondo Matteo” (1965), uma preciosa crônica do itinerário do cineasta na Terra Santa. Embora o toquem profundamente, os lugares da Paixão o decepcionam, sentimento muito claro nos enquadramentos, nos olhares flagrados pelo fotógrafo Tonino Colli, nos comentários e reflexões de Pasolini para o religioso Carraro. Ao procurar o antigo e o sagrado, numa paisagem onde tudo parece queimado na matéria e no espírito, o cineasta encontra a modernidade tirânica e a miséria intolerável.

Hoje, 50 anos da morte do cineasta.

Acima, um trecho do documentário.

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