segunda-feira, 6 de maio de 2024

a palavra no labirinto

“palavra e ar: palavrar / eu sei de cor”, diz a poeta cearense Meire Viana em um dos poemas iniciais de Palabirinto – Experimentos poéticos. Lançado em fevereiro passado (Editora Radiadora), o livro é uma preciosidade no domínio de captação e construção das palavras para expressar o anímico. Os versos acima é conhecimento com a matéria-prima da poesia, afirmação do que ela é capaz de fazer com as “metáforas / em chamas” de sua escrita.

Adentramos com o fio desse novelo de lã vermelho-vinho do delírio que Meire coloca em nossas mãos, como uma Ariadne que nos quer de volta. “Se encontrar saída, me diga”, provoca-me a autora na dedicatória. Como não é para encontrar-se, o jogo e a sina é ficar circulando nos labirintos dos versos. E ao caminhar, quando dobro a esquina de cada folha, deparo-me no espelho do “pra fora calo / pra dentro falo”.
Sei que tenho sua mão trovadora segurando o fio, auscultando meu coração de poeta, para que, mesmo perdido, “me acho / riacho correndo por dentro”. Terseu que somos lendo experimentos para eliminar o Minotauro de nossas inquietações existenciais que vive nessa indevassável ilha Creta da vida, na arquitetura dos dias emaranhados dos Dédalos de cada um de nós.
Os poemas são leves, de asa ceciliana ritmada, porque Meire resolveu “juntar lírico com onírico” e cada verso determinante em neologismo “deu onilírico / o oniilismo do poematriz”, como inventando caminhos na tentativa de descobrir saída. Poemas sem títulos porque é um fio “para de um sopro ler sôfrego de um fôlego só”. Formato, técnica e essência numa estrutura que se aproxima do concretismo, sem perder o rumo “sobre almofadas de nuvem imaginária”. A poeta segue, em referências e reverências, de prumo original, “pelo avesso / sina essa / ida / vinda / vidavessa”, pois “a dor dorme e não sente / dormentesentedormentesente”.
Sublinho com as retinas os versos que escreveria, “repousando o braço da vírgula num canto”. Tudo é linha nessa leitura. Tudo é linho nesse tecido. Tudo é lida nesse livro. Desenho que mapeia o peito. Costura que trata feridas. Trabalho que traz urgências. Na organização do caos poético que se estampa no produto, os poemas curtos nas páginas finais são acenos para voltar, não de despedida, mesmo que “entre o diante / e o distante / o receio do instante”. 

Nenhum comentário: