“É um fenômeno curioso: o país ergue-se indignado, moureja o dia inteiro indignado, come, bebe e diverte-se indignado, mas não passa disto. Falta-lhe o romantismo cívico da agressão. Somos, socialmente, uma coletividade pacífica de revoltados.”
Miguel Torga, poeta, romancista, contista, ensaísta, dramaturgo, memorialista e médico português, escreveu durante 53 anos seus diários publicados em 16 volumes. É uma leitura cativante, com o fôlego narrativo de um romance, uma espécie de epopeia íntima, onde esmiúça reflexões e crítica social e política.
Assim como em toda sua obra, os relatos expressam a rebeldia contra as injustiças, seu inconformismo diante os abusos de poder.
O lúcido raciocínio acima está no Diário IX, 1961. Torga escreveu durante o tempo em que viveu na cidade Chaves, com Portugal sob o Estado Novo, regime autoritário, autocrata, corporativista, que durou por quatro décadas e só acabou com a Revolução dos Cravos, em 1974.
O escritor morou por cinco anos no Brasil durante a adolescência, no interior de Minas Gerais, onde trabalhou na fazenda de café do tio. Ali teve seu primeiro contato prático com a realidade feudal.
O que ele escreveu nos diários há 57 anos, aplica-se muito bem nos tempos temerosos do Brasil de hoje.
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