A primeira lembrança que me vem é sua entrega total, orgânica, ao personagem Angelo em um dos mais belos filmes de todos os tempos, Teorema, de Pier Paolo Pasolini, 1968.
Enigmático, ele chega à casa de uma família burguesa e passa o dia lendo Rimbaud e Tolstoi. Nos elementos estruturados dos personagens, Angelo mais do que um hóspede, é um Deus, pela beleza, poder e mistério. Pasolini à época definiu no livro homônimo (Editora Nova Fronteira, 1968), base paralela para filme, que “o jovem hóspede não é simplesmente um hóspede que vai passar uma estadia numa família de amigos milaneses, é a alegoria de Deus” (pág. 111 da edição de 1983).
Seu jeito de dizer os poemas, alternado com pausas e silêncios anímicos, exerce fascínio sobre aquelas pessoas acomodadas em sua mesmice, levando a consequências inesperadas. Fascínio também sobre nós que imantados acompanhamos a pertinente, provocadora e genial crítica de Pasolini à futilidade e alienação de uma família. No perfil de cada membro, a representação de uma instituição e um segmento da sociedade italiana.
Em salto simétrico no tempo, lembro inevitavelmente de sua estupenda interpretação da transexual Bernadette em Priscilla, a rainha do deserto, de Stephan Elliott, 1994, quando o ator ficou mais em evidência, principalmente para as novas gerações, que passaram a prestar mais atenção em seu talento e carisma com a galeria pavimentada em Super-homem II, em 1980, onde assumiu o papel do vilão General Zod. Stamp voltava de um exílio voluntário na Índia, para “estudo e meditação”, disse.
Para começar a rever tantos personagens instigantes, Teorema, tem, particularmente, um apelo reflexivo. O próprio Terence Stamp voltou a Rimbaud em 1971 no filme Uma temporada no inferno (Une saison em enfer), de Nelo Risi, quando interpretou o poeta e sua relação conturbada com Paul Verlaine e a aventura africana na Etiópia.
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