Foto: Daryan Dornelles/Folhapress
Erasmo Carlos sempre esteve além das ingênuas canções das jovens tardes de domingo. Sobrevivido ao apagão natural do iê-iê-iê, construiu sua carreira paralelamente à grife da parceria Roberto-e-Erasmo, lançando bons discos nas décadas de 70 a 90. Carlos, Erasmo, de 1971, é um álbum essencial, maduro, autêntico, assim como Banda dos contentes, seis anos depois. Ele nunca quis ficar para sempre sentado à beira do caminho.
Quando Paulo César Pinheiro e Sueli Costa compuseram Cordilheira, em 1977, pensaram em Erasmo Carlos. A modulação de uma voz suave para a tensão de uma letra desconcertante. Ele gravou, mas não saiu em disco. A música foi proibida pela censura no governo Geisel. A perturbadora inversão do eu narrador, onde a vítima toma o lugar do algoz, apontava o horror em que vivíamos: "Eu quero ler o coração dos comandantes / condenando os seus soldados pela orgia dos farsantes”, e assim saber da vertigem do poder ao "ter a sensação das cordilheiras / desabando sobre as flores inocentes e rasteiras". Os autores viajaram a Brasília para tentar a liberação e não foram recebidos pelos censores de plantão.
Em 1979, com o início da distensão política no governo Figueiredo, a música foi liberada e gravada por Simone no disco Pedaços. O registro de Erasmo Carlos só foi lançado em 2002, na caixa Mesmo que seja eu, com quinze CDs comemorativos de 50 anos sua carreira.
E hoje, quando se homenageia o Dia do Músico, completa um ano que Erasmo faleceu. Naquele final de manhã do dia 22, ainda marejávamos os olhos sem a luz do sol de Gal Costa, que se foi duas semanas antes.
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