terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

o expresso na linha do tempo

Em 1970 Gilberto Gil estava em Londres, exilado. Num dia de saudade mais apertada do Brasil, escreveu num caderno: "Começou a circular o expresso 2222 que parte direto de Bonsucesso pra depois". E parou por aí. Não conseguiu continuar viagem. Não à toa, deixou "pra depois".

O verso inicial veio da lembrança de sua infância, dos percursos que fazia nos trens da Companhia Leste Brasileira em Salvador, em Ituaçu, em Nazaré das Farinhas. O cantor recorda-se de uma locomotiva com a numeração 222, apitando nas estações, nas curvas, nas distâncias. Acrescentou um 2 na largura da saudade.
Um ano depois Gil pegou o caderno e a canção veio de uma vez, prosseguindo a viagem pela memória, tentando encurtar o tempo em cada verso que surgia.
Bonsucesso entra como rima e solução, pois o cantor marca a geografia afetiva do bairro que gostava no Rio de Janeiro.
A "menina", fictícia e verdadeira da beleza brasileira, chega na segunda parte como mudança rítmica, encadeando os vagões das estrofes, nos trilhos "que não têm fim" pela ausência de casa, quintal e roseira.
Expresso 2222 foi gravada no disco homônimo, lançado em julho de 1972, o cantor já de volta ao Brasil em janeiro daquele ano sombrio.
Gil e Caetano voltaram no período mais cruel da ditadura.
"Até onde essa estrada do tempo vai dar", refletia o expresso na chegada.

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